Prova: XI Exame de Ordem da OAB (2013)
Tipo: Objetiva
Banca:
Atendendo ao pedido de uma estagiária mui educada e gentil que me encontrou no Ministério Público semana passada e declarou-se leitora assídua do blogue do GERT (o carinho com que ela me tratou chegou a emocionar-me), comentarei uma questão de controle de constitucionalidade cobrada no XI Exame de Ordem da OAB. Julguei a questão interessantíssima, máxime por permitir-me abordar o tema da fossilização da Constituição e do seu fenômeno correlato - a fossilização do legislador. Como de praxe, esforcei-me por aprofundar ao máximo o debate à luz da jurisprudência do STF. Tudo em apreço ao leitor do blogue, que o prestigia e divulga (só assim se explicam os mais de 30.000 acessos em ano e meio de existência do projeto).
Questão 15
Após reiteradas decisões sobre determinada matéria,
o Supremo Tribunal Federal (STF) aprovou
enunciado de Súmula Vinculante
determinando que “é inconstitucional lei ou ato normativo estadual ou distrital
que disponha sobre sistemas de
consórcios e sorteios, inclusive bingos e loterias”. O Estado X, contudo, não concordando com a posição do
Supremo Tribunal Federal (STF), edita lei dispondo exatamente sobre os sistemas
de consórcios e sorteios em seu território.
A partir da situação apresentada, assinale a
afirmativa correta.
A) O Supremo Tribunal Federal (STF) poderá, de ofício,
declarar a inconstitucionalidade da norma estadual produzida em desconformidade
com a Súmula.
B) Qualquer cidadão poderá propor a revisão ou o cancelamento de súmula vinculante que, nesse
caso, será declarada mediante a decisão
de dois terços dos membros do Supremo Tribunal Federal (STF).
C) É cabível reclamação perante o Supremo Tribunal
Federal (STF) para questionar a validade da lei do Estado X
que dispõe sobre os sistemas de consórcios e sorteios em seu território.
D) A súmula possui efeitos vinculantes em relação aos órgãos do Poder Judiciário e à Administração
Pública direta e indireta, nas
esferas federal, estadual e municipal,
mas não vincula o Poder Legislativo
na sua atividade legiferante.
1 - Comentários ao item A
A) O Supremo Tribunal Federal (STF) poderá, de ofício, declarar a inconstitucionalidade da norma estadual produzida em desconformidade com a Súmula.
A alternativa A está errada.
Como o Brasil conferiu ao Poder Judiciário a prioridade no exercício do controle de constitucionalidade, é pacífico na doutrina que o a CF/88 adotou um sistema jurisdicional. Tal sistema, contudo, é exercido de forma mista, na medida em que comporta duplamente tanto o controle difuso, de inspiração estadunidense, quando o controle concentrado, de inspiração austríaca.
O controle difuso é aquele que poder ser exercido por qualquer juiz ou tribunal no exercício da jurisdição (daí haver doutrina que o denomina de controle aberto). Nessa hipótese, tem-se um processo constitucional subjetivo, pois as partes estão a litigar em juízo pelo reconhecimento de algum direito. Sua finalidade principal, portanto, é a defesa de direitos, motivo pelo qual se formula um pedido (objeto da demanda). Para avaliar a procedência ou improcedência do pedido, o julgador pode aferir incidentalmente (incidenter tantum) a constitucionalidade de determinado ato normativo. Ou seja, a verificação da compatibilidade do ato do Poder Público com a Constituição far-se-á na fundamentação da decisão de uma demanda cujo objeto principal é a resolução da controvérsia (e não a declaração de inconstitucionalidade).
Por isso, em face de o controle difuso ter como uma de suas características a aferição meramente incidental da constitucionalidade, a compor a fundamentação da decisão, prevalece no STF que ele pode ser feito até mesmo de ofício, senão vejamos (grifos meus):
Porém, esse raciocínio não se aplica ao controle concentrado com finalidade abstrata, que é aquele exercido com exclusividade por um órgão jurisdicional (ou um grupo deles). No Brasil, compete ao STF exercer precipuamente esse controle (CF, art. 102, I, a). A peculiaridade dessa espécie de fiscalização é o seu modus operandi: ele é exercido em tese, independentemente de quaisquer casos concretos. Forma-se, assim, um processo constitucional objetivo, que se volta à defesa da ordem jurídica objetiva, isto é, da supremacia formal do texto constitucional (e não de direitos subjetivos de particulares). Logo, no controle concentrado-abstrato, o objeto da ação é a aferição da compatibilidade do objeto (ato normativo do Poder Público) com o parâmetro (a Constituição).
Nesse prisma, quando se fala em controle concentrado, pressupõe-se que o Supremo Tribunal Federal não poderá agir de ofício, para declarar a inconstitucionalidade de lei. Na hipótese da fiscalização em tese, como objeto principal da ação, é preciso que o órgão jurisdicional seja provocado por algum dos atores legitimados à propositura da ADI, tal como previsto no rol do art. 103 da CF/88 (também previsto no art. 2º da Lei 9.868/99):
Outro equívoco da assertiva reporta-se ainda ao parâmetro (a norma com base na qual é efetuado o controle). Sim, pois, quando o STF atua no controle concentrado-abstrato, fá-lo para declarar a inconstitucionalidade da lei (objeto), tendo por parâmetro o texto da Constituição - e não dos enunciados sumulados. Por mais que sejam vinculantes, os enunciados não equivalem a normas constitucionais; são apenas entendimentos jurisprudenciais aplicados de maneira reiterada pela Corte. Não podem, por conseguinte, servir de parâmetro para o controle. Logo, na hipótese, a declaração de inconstitucionalidade da norma estadual pelo STF teria de ser provocada pela via de ação (até porque a necessidade de provocação é um das características que distinguem a atividade jurisdicional da administrativa, já que esta última pode realizar-se de ofício) e com base em parâmetro constitucional - nunca jurisprudencial. A defesa da jurisprudência consolidada é feita pela via da reclamação (CF/88, art. 102, I, l, c/c art. 13 e ss. da Lei 8.038/90).
O controle difuso é aquele que poder ser exercido por qualquer juiz ou tribunal no exercício da jurisdição (daí haver doutrina que o denomina de controle aberto). Nessa hipótese, tem-se um processo constitucional subjetivo, pois as partes estão a litigar em juízo pelo reconhecimento de algum direito. Sua finalidade principal, portanto, é a defesa de direitos, motivo pelo qual se formula um pedido (objeto da demanda). Para avaliar a procedência ou improcedência do pedido, o julgador pode aferir incidentalmente (incidenter tantum) a constitucionalidade de determinado ato normativo. Ou seja, a verificação da compatibilidade do ato do Poder Público com a Constituição far-se-á na fundamentação da decisão de uma demanda cujo objeto principal é a resolução da controvérsia (e não a declaração de inconstitucionalidade).
Por isso, em face de o controle difuso ter como uma de suas características a aferição meramente incidental da constitucionalidade, a compor a fundamentação da decisão, prevalece no STF que ele pode ser feito até mesmo de ofício, senão vejamos (grifos meus):
E M E N T A - Recurso extraordinário: interposição de
decisão do STJ em recurso especial: inadmissibilidade, se a questão constitucional
de que se ocupou o acórdão recorrido ja fora suscitada e resolvida na decisão
de segundo grau e, ademais, constitui fundamento suficiente da decisão da
causa.
1. Do sistema constitucional vigente, que prevê o cabimento simultâneo
de recurso extraordinário e de recurso especial contra o mesmo acórdão dos
tribunais de segundo grau, decorre que da decisão do STJ, no recurso especial,
só se admitira recurso extraordinário se a questão constitucional objeto do
último for diversa da que já tiver sido resolvida pela instância ordinária.
2.
Não se contesta que, no sistema difuso de controle de
constitucionalidade, o STJ, a exemplo de todos os demais órgãos jurisdicionais
de qualquer instância, tenha o poder de declarar incidentemente a
inconstitucionalidade da lei, mesmo de oficio; o que não e dado aquela
Corte, em recurso especial, e rever a decisão da mesma questão constitucional
do tribunal inferior; se o faz, de duas uma: ou usurpa a competência do STF, se
interposto paralelamente o extraordinário ou, caso contrario, ressuscita
matéria preclusa.
3. Ademais, na hipótese, que e a do caso - em que a solução da
questão constitucional, na instância ordinária, constitui fundamento bastante
da decisão da causa e não foi impugnada mediante recurso extraordinário, antes
que a preclusão da matéria, e a coisa julgada que inibe o conhecimento do
recurso especial.
(STF, Tribunal Pleno, AI 145.589/RJ, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, j. 02/09/1993, p. DJ 24/06/1994).
COMPETÊNCIA – MANDADO DE SEGURANÇA – ATO DE TURMA
RECURSAL. O julgamento do mandado de segurança contra ato de turma recursal
cabe à própria turma, não havendo campo para atuação quer de tribunal de
justiça, quer do Superior Tribunal de Justiça. Precedente: Questão de Ordem no
Mandado de Segurança nº 24.691/MG, Plenário, 4 de dezembro de 2003, redator do
acórdão Ministro Sepúlveda Pertence. CONTROLE DIFUSO DE CONSTITUCIONALIDADE
– SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. Todo e qualquer órgão investido do ofício judicante
tem competência para proceder ao controle difuso de
constitucionalidade. Por isso, cumpre ao Superior Tribunal de Justiça,
ultrapassada a barreira de conhecimento do especial, apreciar a causa e,
surgindo articulação de inconstitucionalidade de ato normativo envolvido na
espécie, exercer, provocado ou não, o controle difuso de
constitucionalidade. Considerações. AGRAVO REGIMENTAL – JULGAMENTO SUMÁRIO. A
circunstância de o agravo regimental ser examinado de forma sumária é
conducente a assentar-se o provimento quando não alcançada a unanimidade no
Colegiado – salutar doutrina trazida do Superior Tribunal de Justiça pelo
saudoso Ministro Menezes Direito e adotada pelo relator.
(STF, Tribunal Pleno, AI 666.523 AgR/BA, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, j. 26/10/2010, p. DJe 02/12/2010).
Nesse prisma, quando se fala em controle concentrado, pressupõe-se que o Supremo Tribunal Federal não poderá agir de ofício, para declarar a inconstitucionalidade de lei. Na hipótese da fiscalização em tese, como objeto principal da ação, é preciso que o órgão jurisdicional seja provocado por algum dos atores legitimados à propositura da ADI, tal como previsto no rol do art. 103 da CF/88 (também previsto no art. 2º da Lei 9.868/99):
Art. 103. Podem propor a ação direta de
inconstitucionalidade e a ação declaratória de constitucionalidade:
Outro equívoco da assertiva reporta-se ainda ao parâmetro (a norma com base na qual é efetuado o controle). Sim, pois, quando o STF atua no controle concentrado-abstrato, fá-lo para declarar a inconstitucionalidade da lei (objeto), tendo por parâmetro o texto da Constituição - e não dos enunciados sumulados. Por mais que sejam vinculantes, os enunciados não equivalem a normas constitucionais; são apenas entendimentos jurisprudenciais aplicados de maneira reiterada pela Corte. Não podem, por conseguinte, servir de parâmetro para o controle. Logo, na hipótese, a declaração de inconstitucionalidade da norma estadual pelo STF teria de ser provocada pela via de ação (até porque a necessidade de provocação é um das características que distinguem a atividade jurisdicional da administrativa, já que esta última pode realizar-se de ofício) e com base em parâmetro constitucional - nunca jurisprudencial. A defesa da jurisprudência consolidada é feita pela via da reclamação (CF/88, art. 102, I, l, c/c art. 13 e ss. da Lei 8.038/90).
2 - Comentários ao item B
B) Qualquer cidadão poderá propor a revisão ou o cancelamento de súmula vinculante que, nesse caso, será declarada mediante a decisão de dois terços dos membros do Supremo Tribunal Federal (STF).
A alternativa B está errada.
Como produto das reformas operadas pela Emenda Constitucional º 45/04, a "súmula vinculante" teve parte de seu regramento previsto no próprio texto constitucional. A esse respeito, vamos observar o estatuído no art. 103-A da CF/88:
Da leitura do § 2º do art. 103-A acima citado, o leitor já pode identificar que o legislador constituinte não permitiu a participação ampla dos cidadãos no processo da "súmula vinculante". Pelo contrário, ao dispor sobre a legitimidade para a proposta de edição, cancelamento ou revisão de enunciado da súmula de jurisprudência vinculante, estabeleceu um piso de legitimados, atrelando-o ao rol dos atores capazes de manejar a ADI (CF/88, art. 103).
Todavia, note o leitor que o próprio texto constitucional ressalva que o piso de legitimados é prescrito "sem prejuízo do que vier a ser estabelecido em lei". Abriu-se, consequentemente, margem para a atuação discricionária do legislador ordinário.
Pois foi com base nisso que, ulteriormente, o legislador infraconstitucional editou a Lei 11.417/06- a lei regulamentadora do art. 103-A da Constituição. Ao fazê-lo, optou por ampliar o rol de legitimados para a proposta de edição, revisão ou cancelamento de "súmula vinculante".
Nesse sentido, dada sua completude, consultemos o teor do art. 3º da Lei 11.417/06:
Sintetizando o rol de legitimados, posso definir, conclusivamente, que são legitimados para a edição, revisão ou cancelamento de súmula vinculante:
1) Legitimados para a propositura da ADI: I - o Presidente da República; II - a Mesa do Senado Federal; III – a Mesa da Câmara dos Deputados; IV – o Procurador-Geral da República; V - o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil; VII – partido político com representação no Congresso Nacional; VIII – confederação sindical ou entidade de classe de âmbito nacional; IX – a Mesa de Assembleia Legislativa ou da Câmara Legislativa do Distrito Federal; X - o Governador de Estado ou do Distrito Federal;
2) Legitimados da Lei 11.417/06: VI - o Defensor Público-Geral da União; XI - os Tribunais Superiores, os Tribunais de Justiça de Estados ou do Distrito Federal e Territórios, os Tribunais Regionais Federais, os Tribunais Regionais do Trabalho, os Tribunais Regionais Eleitorais e os Tribunais Militares.
Finalmente, chamo a atenção do leitor para uma disposição inusitada. Segundo o § 1º do art. 3º da Lei 11.417/06, o Município também é legitimado para propor a edição, revisão ou cancelamento de "súmula vinculante", contanto que o faço incidentalmente ao curso de processo em que seja parte, sem que tal proposta acarrete a suspensão do processo. A contrario sensu, significa dizer que, à diferença dos demais legitimados, que podem propor tanto direta quanto incidentalmente a edição, revisão ou cancelamento de "súmula vinculante", os Municípios só podem provocar o STF de maneira incidental, isto é, durante o curso de processos em que seja parte.
Portanto, não cabe reclamação constitucional para o fim de impugnar/questionar a validade de lei ou outro ato normativo. Para esse propósito, o autor deve agitar a ação direta de inconstitucionalidade, de modo a abrir a via do controle principal (principaliter tantum) de fiscalização abstrata da constitucionalidade das leis e atos normativos do Poder Público.
4 - Comentários ao item D
Art. 103-A. O Supremo Tribunal Federal poderá, de
ofício ou por provocação, mediante decisão de dois terços dos seus membros,
após reiteradas decisões sobre matéria constitucional, aprovar súmula que, a
partir de sua publicação na imprensa oficial, terá efeito vinculante em relação
aos demais órgãos do Poder Judiciário e à administração pública direta e
indireta, nas esferas federal, estadual e municipal, bem como proceder à sua
revisão ou cancelamento, na forma estabelecida em lei.
§
1º A súmula terá por objetivo a validade, a interpretação e a eficácia de
normas determinadas, acerca das quais haja controvérsia atual entre órgãos
judiciários ou entre esses e a administração pública que acarrete grave
insegurança jurídica e relevante multiplicação de processos sobre questão
idêntica.
§
2º Sem prejuízo do que vier a ser estabelecido em lei, a aprovação, revisão ou
cancelamento de súmula poderá ser provocada por aqueles que podem propor a ação
direta de inconstitucionalidade.
§
3º Do ato administrativo ou decisão judicial que contrariar a súmula aplicável
ou que indevidamente a aplicar, caberá reclamação ao Supremo Tribunal Federal
que, julgando-a procedente, anulará o ato administrativo ou cassará a decisão
judicial reclamada, e determinará que outra seja proferida com ou sem a
aplicação da súmula, conforme o caso.
Da leitura do § 2º do art. 103-A acima citado, o leitor já pode identificar que o legislador constituinte não permitiu a participação ampla dos cidadãos no processo da "súmula vinculante". Pelo contrário, ao dispor sobre a legitimidade para a proposta de edição, cancelamento ou revisão de enunciado da súmula de jurisprudência vinculante, estabeleceu um piso de legitimados, atrelando-o ao rol dos atores capazes de manejar a ADI (CF/88, art. 103).
Todavia, note o leitor que o próprio texto constitucional ressalva que o piso de legitimados é prescrito "sem prejuízo do que vier a ser estabelecido em lei". Abriu-se, consequentemente, margem para a atuação discricionária do legislador ordinário.
Pois foi com base nisso que, ulteriormente, o legislador infraconstitucional editou a Lei 11.417/06- a lei regulamentadora do art. 103-A da Constituição. Ao fazê-lo, optou por ampliar o rol de legitimados para a proposta de edição, revisão ou cancelamento de "súmula vinculante".
Nesse sentido, dada sua completude, consultemos o teor do art. 3º da Lei 11.417/06:
Art. 3º São legitimados a propor a edição, a
revisão ou o cancelamento de enunciado de súmula vinculante:
I
- o Presidente da República;
II
- a Mesa do Senado Federal;
III
– a Mesa da Câmara dos Deputados;
IV
– o Procurador-Geral da República;
V
- o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil;
VI
- o Defensor Público-Geral da União;
VII
– partido político com representação no Congresso Nacional;
VIII
– confederação sindical ou entidade de classe de âmbito nacional;
IX
– a Mesa de Assembléia Legislativa ou da Câmara Legislativa do Distrito
Federal;
X
- o Governador de Estado ou do Distrito Federal;
XI
- os Tribunais Superiores, os Tribunais de Justiça de Estados ou do Distrito
Federal e Territórios, os Tribunais Regionais Federais, os Tribunais Regionais
do Trabalho, os Tribunais Regionais Eleitorais e os Tribunais Militares.
§
1º O Município poderá propor, incidentalmente ao curso de processo em que
seja parte, a edição, a revisão ou o cancelamento de enunciado de súmula
vinculante, o que não autoriza a suspensão do processo.
§
2º No procedimento de edição, revisão ou cancelamento de enunciado da súmula
vinculante, o relator poderá admitir, por decisão irrecorrível, a manifestação
de terceiros na questão, nos termos do Regimento Interno do Supremo Tribunal
Federal.
Sintetizando o rol de legitimados, posso definir, conclusivamente, que são legitimados para a edição, revisão ou cancelamento de súmula vinculante:
1) Legitimados para a propositura da ADI: I - o Presidente da República; II - a Mesa do Senado Federal; III – a Mesa da Câmara dos Deputados; IV – o Procurador-Geral da República; V - o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil; VII – partido político com representação no Congresso Nacional; VIII – confederação sindical ou entidade de classe de âmbito nacional; IX – a Mesa de Assembleia Legislativa ou da Câmara Legislativa do Distrito Federal; X - o Governador de Estado ou do Distrito Federal;
2) Legitimados da Lei 11.417/06: VI - o Defensor Público-Geral da União; XI - os Tribunais Superiores, os Tribunais de Justiça de Estados ou do Distrito Federal e Territórios, os Tribunais Regionais Federais, os Tribunais Regionais do Trabalho, os Tribunais Regionais Eleitorais e os Tribunais Militares.
Finalmente, chamo a atenção do leitor para uma disposição inusitada. Segundo o § 1º do art. 3º da Lei 11.417/06, o Município também é legitimado para propor a edição, revisão ou cancelamento de "súmula vinculante", contanto que o faço incidentalmente ao curso de processo em que seja parte, sem que tal proposta acarrete a suspensão do processo. A contrario sensu, significa dizer que, à diferença dos demais legitimados, que podem propor tanto direta quanto incidentalmente a edição, revisão ou cancelamento de "súmula vinculante", os Municípios só podem provocar o STF de maneira incidental, isto é, durante o curso de processos em que seja parte.
3 - Comentários ao item C
C) É cabível reclamação perante o Supremo Tribunal Federal (STF) para questionar a validade da lei do Estado X que dispõe sobre os sistemas de consórcios e sorteios em seu território.
A alternativa C está errada.
O cabimento da reclamação constitucional está previsto no art. 102, I, l, da CF/88. In verbis:
Vê-se, portanto, que a reclamação constitucional tem cabimento estritamente atrelado às hipóteses figuradas no texto normativo, a saber: (1) preservar a competência do tribunal; e (2) garantir a autoridade das decisões do tribunal.
A jurisprudência do STF tem corroborado esse entendimento. Anoto os seguintes precedentes(grifos meus):
Art. 102. Compete ao Supremo Tribunal Federal,
precipuamente, a guarda da Constituição, cabendo-lhe:
omissis
l) a reclamação para a preservação de sua competência
e garantia da autoridade de suas decisões;
Vê-se, portanto, que a reclamação constitucional tem cabimento estritamente atrelado às hipóteses figuradas no texto normativo, a saber: (1) preservar a competência do tribunal; e (2) garantir a autoridade das decisões do tribunal.
A jurisprudência do STF tem corroborado esse entendimento. Anoto os seguintes precedentes(grifos meus):
EMENTA Agravo regimental na reclamação. Administrativo
e Processual Civil. Dissídio entre servidor e o poder público. ADI nº 3.395/DF-MC.
Cabimento da reclamação. Incompetência da Justiça do Trabalho.
1. Por
atribuição constitucional, presta-se a reclamação para preservar a competência
do STF e garantir a autoridade das decisões deste Tribunal (art. 102, inciso I,
alínea l, CF/88), bem como para resguardar a correta aplicação das súmulas
vinculantes (art. 103-A, § 3º, CF/88). Não se reveste de caráter primário ou se
transforma em sucedâneo recursal quando é utilizada para confrontar decisões de
juízos e tribunais que afrontam o conteúdo do acórdão do STF na ADI nº
3.395/DF-MC.
2. Compete à Justiça comum pronunciar-se sobre a existência, a
validade e a eficácia das relações entre servidores e o poder público fundadas
em vínculo jurídico-administrativo. O problema relativo à publicação da lei
local que institui o regime jurídico único dos servidores públicos ultrapassa
os limites objetivos da espécie sob exame.
3. Não descaracteriza a competência
da Justiça comum, em tais dissídios, o fato de se requererem verbas
rescisórias, FGTS e outros encargos de natureza símile, dada a prevalência da
questão de fundo, que diz respeito à própria natureza da relação
jurídico-administrativa, ainda que desvirtuada ou submetida a vícios de origem.
4. Agravo regimental não provido.
(STF, Tribunal Pleno, Rcl 7857 AgR/CE, Rel. Min. Dias Toffoli, j. 06/02/2013, p. DJe 01/03/2013).
EMENTA Direito Administrativo e Processual Civil
agravo regimental em reclamação desapropriação por interesse social para
reforma agrária produtividade usurpação da competência do STF ausência
agravo regimental não provido.
1. É insuscetível de discussão em mandado de
segurança questão relativa à produtividade de imóvel rural objeto de desapropriação
para fins de reforma agrária, por exigir essa discussão ampla dilação
probatória, resguardada a possibilidade de exame da matéria pelas vias
ordinárias.
2. A competência originária do STF está submetida a regime de
direito estrito, não estando incluída, no rol taxativo do art. 102, inciso I,
da CF/88, a competência para julgamento de ação declaratória de produtividade
de imóvel rural.
3. Ação cautelar inominada, em razão de sua natureza
acessória, deve tramitar no juízo competente para conhecer da causa principal
cujo resultado útil se procura assegurar.
4. Caráter estrito da competência do
STF no conhecimento de reclamação constitucional, a qual não pode ser usada
como sucedâneo de instrumentos processuais colocados à disposição do
jurisdicionado para a solução de incidentes que afetem o transcorrer da relação
processual originária.
5. Agravo regimental não provido.
(STF, Tribunal Pleno, Rcl 4612/PE, Rel. Min. Dias Toffoli, j. 11/04/2013, p. DJe 03/06/2013).
Portanto, não cabe reclamação constitucional para o fim de impugnar/questionar a validade de lei ou outro ato normativo. Para esse propósito, o autor deve agitar a ação direta de inconstitucionalidade, de modo a abrir a via do controle principal (principaliter tantum) de fiscalização abstrata da constitucionalidade das leis e atos normativos do Poder Público.
4 - Comentários ao item D
D) A súmula possui efeitos vinculantes em relação aos órgãos do Poder Judiciário e à Administração Pública direta e indireta, nas esferas federal, estadual e municipal, mas não vincula o Poder Legislativo na sua atividade legiferante.
A alternativa D está correta.
Inicialmente, cabe observar que a técnica de fiscalização da constitucionalidade de leis e atos normativos não corresponde a uma tentativa de manietar as forças do Poder Legislativo. Por outras palavras, da mesma maneira que não se pode obrigar o legislador a legislar, tampouco se pode impedi-lo de legislar. Mesmo quando já exista posicionamento consolidado no STF quanto à inconstitucionalidade de determinada prescrição normativa, inclusive com reconhecimento em sentença prolatada no controle abstrato, o legislador é livre para legislar em sentido contrário ao decidido pela Suprema Corte. Daí decorre a disposição inscrita no § 2º do art. 102 da CF/88:
Note o leitor que o parágrafo acima restringe a eficácia vinculante das decisões proferidas pelo STF em sede de controle de constitucionalidade concentrado-abstrato tão somente aos órgãos do Poder Judiciário e da Administração Pública. A omissão do Poder Legislativo é proposital, já que a técnica do controle não pode vir a cercear a atuação legiferante do Parlamento, sob pena de comprometer a repartição dos Poderes republicanos, além de fomentar o fenômeno da fossilização da Constituição.
Nesse sentido, o precedente assentado na Rcl 467 é esclarecedor (grifo meu):
Portanto, é notória que as decisões definitivas de mérito, proferidas pelo Supremo Tribunal Federal, nas ações diretas de inconstitucionalidade tem efeito vinculante limitado aos órgãos dos Poderes Executivo e Judiciário - raciocínio que, dado o caráter dúplice dessa via, pode ser perfeitamente estendido às ações declaratórias de constitucionalidade. Tal conclusão é confirmada pelo parágrafo único do art. 28 da Lei 9.868/99, in verbis (grifo meu):
Fiz questão de introduzir esse raciocínio, porquanto seus fundamentos, posto que extraídos da teoria do controle de constitucionalidade, aplicar-se-ão integralmente aos efeitos da "súmula vinculante".
De fato, também nessa seara, a "súmula vinculante" editada, revisada ou cancelada tem seus efeitos restritos aos órgãos do Poder Judiciário ou do Poder Executivo, não abarcando os órgãos do Poder Legislativo. Ao fim e ao cabo, é o que está consagrado, de maneira expressa, no caput do art. 103-A da CF/88 (grifo meu):
Tal qual sucede na teoria do controle de constitucionalidade, a exclusão proposital do Poder Legislativo, subtraindo-o dos efeitos vinculantes do enunciado de jurisprudência cristalizado, visa a resguardar a atuação do Parlamento no seu mister republicano típico (inovar o ordenamento jurídico por meio da elaboração de leis).
Desse modo, o legislador, quando do exercício do seu múnus legiferante, não fica vinculado ao conteúdo do enunciado da súmula de jurisprudência vinculante do STF, caso contrário, ter-se-ia, paralelamente ao que ocorre no controle de constitucionalidade, a fossilização do legislador.
Art. 102 omissis
§ 2º As decisões definitivas de mérito, proferidas
pelo Supremo Tribunal Federal, nas ações diretas de inconstitucionalidade e nas
ações declaratórias de constitucionalidade produzirão eficácia contra todos e
efeito vinculante, relativamente aos demais órgãos do Poder Judiciário e à
administração pública direta e indireta, nas esferas federal, estadual e
municipal.
Note o leitor que o parágrafo acima restringe a eficácia vinculante das decisões proferidas pelo STF em sede de controle de constitucionalidade concentrado-abstrato tão somente aos órgãos do Poder Judiciário e da Administração Pública. A omissão do Poder Legislativo é proposital, já que a técnica do controle não pode vir a cercear a atuação legiferante do Parlamento, sob pena de comprometer a repartição dos Poderes republicanos, além de fomentar o fenômeno da fossilização da Constituição.
Nesse sentido, o precedente assentado na Rcl 467 é esclarecedor (grifo meu):
RECLAMAÇÃO - AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE -
GARANTIA DA AUTORIDADE DE DECISÃO DO STF - CABIMENTO - INOCORRENCIA DO
DESCUMPRIMENTO ALEGADO - PEDIDO INDEFERIDO . - A jurisprudência do Supremo
Tribunal Federal tem reconhecido a possibilidade de utilização, ainda que em
caráter excepcional, da via reclamatória como instrumento processual idôneo de
preservação da autoridade decisória dos julgados proferidos em sede de ação
direta de inconstitucionalidade. Precedentes . - A instauração do controle
normativo abstrato perante o Supremo Tribunal Federal não impede que o Estado
venha a dispor, em novo ato legislativo, sobre a mesma matéria versada nos atos
estatais impugnados, especialmente quando o conteúdo material da nova lei
implicar tratamento jurídico diverso daquele resultante das normas questionadas
na ação direta de inconstitucionalidade.
(STF, Tribunal Pleno, Rcl 467/DF, Rel. Min. Celso de Mello, j. 09/10/1994, p. DJ 09/12/1994).
Portanto, é notória que as decisões definitivas de mérito, proferidas pelo Supremo Tribunal Federal, nas ações diretas de inconstitucionalidade tem efeito vinculante limitado aos órgãos dos Poderes Executivo e Judiciário - raciocínio que, dado o caráter dúplice dessa via, pode ser perfeitamente estendido às ações declaratórias de constitucionalidade. Tal conclusão é confirmada pelo parágrafo único do art. 28 da Lei 9.868/99, in verbis (grifo meu):
Art. 28. Dentro do prazo de dez dias após o trânsito
em julgado da decisão, o Supremo Tribunal Federal fará publicar em seção
especial do Diário da Justiça e do Diário Oficial da União a parte dispositiva
do acórdão.
Parágrafo único. A declaração de constitucionalidade
ou de inconstitucionalidade, inclusive a interpretação conforme a Constituição
e a declaração parcial de inconstitucionalidade sem redução de texto, têm
eficácia contra todos e efeito vinculante em relação aos órgãos do Poder
Judiciário e à Administração Pública federal, estadual e municipal.
Fiz questão de introduzir esse raciocínio, porquanto seus fundamentos, posto que extraídos da teoria do controle de constitucionalidade, aplicar-se-ão integralmente aos efeitos da "súmula vinculante".
De fato, também nessa seara, a "súmula vinculante" editada, revisada ou cancelada tem seus efeitos restritos aos órgãos do Poder Judiciário ou do Poder Executivo, não abarcando os órgãos do Poder Legislativo. Ao fim e ao cabo, é o que está consagrado, de maneira expressa, no caput do art. 103-A da CF/88 (grifo meu):
Art. 103-A. O Supremo Tribunal Federal poderá, de
ofício ou por provocação, mediante decisão de dois terços dos seus membros,
após reiteradas decisões sobre matéria constitucional, aprovar súmula que, a
partir de sua publicação na imprensa oficial, terá efeito vinculante em relação
aos demais órgãos do Poder Judiciário e à administração pública direta e
indireta, nas esferas federal, estadual e municipal, bem como proceder à sua
revisão ou cancelamento, na forma estabelecida em lei.
Tal qual sucede na teoria do controle de constitucionalidade, a exclusão proposital do Poder Legislativo, subtraindo-o dos efeitos vinculantes do enunciado de jurisprudência cristalizado, visa a resguardar a atuação do Parlamento no seu mister republicano típico (inovar o ordenamento jurídico por meio da elaboração de leis).
Desse modo, o legislador, quando do exercício do seu múnus legiferante, não fica vinculado ao conteúdo do enunciado da súmula de jurisprudência vinculante do STF, caso contrário, ter-se-ia, paralelamente ao que ocorre no controle de constitucionalidade, a fossilização do legislador.
Parabéns! brilhante explicação! :)
ResponderExcluirObrigado, Taiane! Todo o esforço despendido na elaboração dos textos no blogue só faz sentido quando se pode partilhar conhecimento com os leitores. Assim, espero que sempre retornes ao blogue! És muito bem-vinda!
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