Min. Rosa Weber, defensora da técnica da declaração de inconstitucionalidade sem pronúncia de nulidade no julgamento das ADIs 4947, 4963, 5020, 5028 e 5130. |
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de Federico Jusid e Emilio Kauderer.
No mês de junho de 2014, o Plenário do STF
realizou julgamento conjunto das Ações Diretas de Inconstitucionalidade 4947, 4963, 4965, 5020, 5028 e 5130. Em todas essas ADIs,
basicamente, os autores impugnavam a constitucionalidade da Resolução nº 23.389/2013
do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), que “dispõe sobre o número de membros da
Câmara dos Deputados e das Assembleias e Câmara Legislativa para as Eleições de
2014”.
Pois bem. Ao final do julgamento, a maioria
dos ministros da Corte considerou inconstitucional o parágrafo único do artigo
1º da Lei Complementar 78/1993, que autoriza o TSE a definir o tamanho das
bancadas dos Estados e do Distrito Federal na Câmara dos Deputados.
Consequentemente, a Resolução 23.389/2013, editada com base naquele
dispositivo, também foi considerada inconstitucional.
Nesse importante precedente, quero analisar
alguns aspectos interessantes do julgado, especialmente no que se refere à
técnica da modulação de efeitos no controle abstrato de constitucionalidade.
Inicialmente, é preciso frisar que não houve quorum
para que o Plenário realizasse a modulação de efeitos da decisão tomada na
análise conjunta do mérito das ADIs. Aqui vale relembrar o teor do art. 27 da
Lei 9.868/99, que regula o processo e julgamento das ações diretas de
inconstitucionalidade perante o Supremo Tribunal Federal:
Art. 27. Ao declarar a inconstitucionalidade de lei
ou ato normativo, e tendo em vista razões de segurança jurídica ou de
excepcional interesse social, poderá o Supremo Tribunal Federal, por maioria de
dois terços de seus membros, restringir os efeitos daquela declaração ou
decidir que ela só tenha eficácia a partir de seu trânsito em julgado ou de
outro momento que venha a ser fixado.
Note o leitor que a maioria de dois terços referida
na redação acima equivale, na prática, ao voto de 8 (oito) ministros da Suprema
Corte. No julgamento em apreço, tal patamar não foi atingido. Assim, como o quorum
do art. 27 da Lei das ADIs não foi alcançado (o Min. Joaquim Barbosa não aderiu
à corrente que propunha a modulação), o Plenário do STF, por maioria, decidiu
acompanhar o entendimento da ministra Rosa Weber, a qual propugnou, com fundamento
no princípio da segurança jurídica e da anualidade, a declaração de
inconstitucionalidade sem pronúncia de nulidade. Diante disso, o Tribunal
adotou os critérios estabelecidos na Resolução 23.389/2013, enquanto não for
editada nova lei complementar.
A adoção da técnica da declaração de
inconstitucionalidade sem pronúncia de nulidade remete às múltiplas
possibilidades de modulação de efeitos da decisão no controle de
constitucionalidade concentrado-abstrato. Essa modulação é relevante no
contexto brasileiro, cujo sistema normativo de fiscalização abstrata da
validade dos atos do Poder Público tradicionalmente adota teoria estadunidense da
nulidade da lei inconstitucional. Segundo essa teorização, a decisão declaratória
de inconstitucionalidade tem eficácia retroativa (ex tunc), haja vista apenas reconhecer
uma situação preexistente, qual seja, a de que a norma é nula de pleno direito.
Logo, o ato considerado inválido à luz da Constituição não produz efeitos nem
pode ser convalidado.
Ocorre que a aplicação pura e simples da
teoria estadunidense da nulidade do ato inconstitucional acarreta problemas.
Com efeito, nem sempre a eficácia ex tunc pode desfazer as consequências de
ordem prática que a aplicação da norma inválida acarretou durante o período de
sua vigência. Disso surgiu a necessidade de se proceder a uma relativização da
teoria da nulidade. Eis então o advento das técnicas da modulação temporal dos
efeitos da declaração de inconstitucionalidade no Direito brasileiro.
Nesse contexto é que o legislador inseriu o já
citado art. 27 na Lei 9.868/99. Seu propósito é assegurar a modulação da declaração
de inconstitucionalidade, facultando ao STF as possibilidades seguintes:
(1) Declaração de inconstitucionalidade com
efeitos ex nunc: a Corte Suprema define que a declaração de inconstitucionalidade
vale a partir do trânsito em julgado da decisão;
(2) Declaração de inconstitucionalidade com
efeito pro futuro: a sentença que declara a inconstitucionalidade fixa um
período de tempo no qual a decisão tem seus efeitos suspensos;
(3) Declaração de inconstitucionalidade sem a
pronúncia de nulidade: a Corte Suprema reconhece que a norma é inconstitucional,
mas a mantém no ordenamento jurídico até que nova lei seja editada em sua substituição.
Isto é, a eficácia da lei fica suspensa até que o legislador manifeste-se sobre
a situação inconstitucional.
Foi justamente essa última técnica de
interpretação que o STF empregou no julgamento conjunto das ADIs 4947, 4963,
4965, 5020, 5028 e 5130. Como visto, a maioria dos ministros acompanhou o voto
da Min. Rosa Weber, a qual defendeu que fosse declarada a inconstitucionalidade
sem pronúncia de nulidade do parágrafo único do art. 1º da LC 78/93.
Esse pensamento veio a predominar na Corte,
em face de o Plenário ter entendido que o afastamento ex tunc do dispositivo impugnado
nas ações diretas criaria um vácuo normativo altamente prejudicial à
Constituição. Por sinal, este é o cerne da adoção da técnica da declaração de
inconstitucionalidade sem pronúncia de nulidade: evitar que a supressão pura e
simples do ato normativo do Poder Público possa gerar um vácuo jurídico
(ausência de regra apta a regular a situação normatizada) que se mostra, no
caso concreto, bem mais danoso ao texto constitucional que a própria manutenção
da norma invalidada. Logo, mediante a declaração de inconstitucionalidade sem
pronúncia de nulidade, o STF acaba optando pelo raciocínio “dos males, o menor”.
A bem dizer, faz menos mal à Constituição a mantença do ato inconstitucional
que a sua total exclusão do sistema normativo, dado o risco causado pelo vácuo
normativo para a regulação da vida em sociedade.
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