Min. Maria Thereza de Assis Moura, relatora do REsp 1.193.196/MG (tema 593 dos recursos repetitivos) no STJ. |
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String Quartet No. 2 in D minor" (2015),
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Um disco essencial não só para conhecer a obra do compositor tcheco Bedřich Smetana,
mas para aprofundar o conhecimento na estética musical do concerto camerístico.
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1 - Introdução
Entre os princípios aplicáveis ao Direito
Penal, encontra-se o princípio da
adequação social, cujo defensor de maior destaque no cenário doutrinário
mundial foi o penalista alemão Hans Welzel (1904-1977). Trata-se de vetor
principiológico que estimula o intérprete da norma penal a refletir quanto à relevância
social da conduta que se quer punir em juízo. A partir desse ponto de
vista, constrói-se o raciocínio segundo o qual a conduta socialmente
irrelevante não pode ser sancionada penalmente, ainda que tipificada em lei
incriminadora.
A tese doutrinária que informa o princípio da
adequação social parte da premissa de que a conduta socialmente irrelevante corresponde
à conduta socialmente adequada. A adequação social de uma conduta, em
consequência desse princípio, não autoriza que se proceda validamente a um
juízo de tipicidade, enquadrando-a para fins de punição penal. Logo, a conduta
socialmente adequada não pode ser considerada criminosa.
O debate acadêmico, derredor do princípio da
adequação social, tem grande aplicação na vida pretoriana. Com efeitos, são frequentes
os casos de réus acusados da prática delitiva de vender ou expor à venda CDs ou
DVDs “piratas”. Nessas circunstâncias, a “pirataria” urbana enquadrar-se-ia como
crime contra a propriedade intelectual, mais precisamente na figura típica do
crime de violação de direito autoral, na forma do art. 184, § 2º, do CP.
Apesar disso, não se pode ignorar que é
grande a tolerância da sociedade em relação a esse tipo de comércio. Há um
mercado paralelo da venda de CDs e DVDs piratas que conta com grande adesão dos
consumidores, que muita vez tem acesso aos produtos até mesmo em espaços públicos
das cidades brasileiras.
Presente esse contexto, tem sido comum nos
tribunais a suscitação da tese defensiva, que advoga a descriminalização dessas
condutas de vender ou expor à venda CDs e DVDs piratas, em face da aplicação do
princípio da adequação social. Alfim, seria possível afastar a tipicidade do crime
do art. 184, § 2º, do CP, reconhecendo-o como norma penal incriminadora de
conduta socialmente irrelevante, porquanto socialmente adequada?
O objetivo deste artigo é responder a essa
interrogante, máxime com base no estudo do pensamento jurídico esposado na
matéria pela jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça.
2 - Princípios da
adequação social e da intervenção mínima no Direito Penal
A invocação do princípio da adequação social
remete, em alguma medida, ao conhecido princípio
da intervenção mínima, cujos destinatários precípuos são o legislador e o
intérprete do direito.
Consoante o princípio da intervenção mínima,
o Direito Penal não se deve constituir em instrumento de controle social
prioritário. Pelo contrário, ao elaborar a legislação incriminadora, esse
princípio impõe que o legislador busque restringir os tipos penais tão somente
àquelas condutas estritamente necessárias à segurança do corpo social. Do
influxo desse princípio decorre também que, sempre que possível, o operador do
direito deve envidar esforços no sentido de priorizar o emprego de outros
subsistemas jurídicos (esfera administrativa, esfera civil etc.), para sancionar
ações proibidas, em detrimento à interveniência direta, altamente destrutiva,
do Direito Penal.
Dizer que a intervenção no Direito Penal deve
ser mínima implica igualmente admitir que o elenco de condutas típicas
inscritas na norma incriminadora não pode abranger todo e qualquer
comportamento, como sucederia em um Estado policialesco, cultor, notadamente,
de um Direito Penal de caráter simbólico-repressivista.
Nesse contexto, parece-me de fundamental
importância recordar que a moderna teoria do fato típico tem talhado seus
fundamentos proibitivos com fulcro na identificação da tipicidade material a
partir do desvalor social da ação e do resultado.
Cézar Roberto Bitencourt (2003, p. 17) esclarece
a questão:
A tipicidade de um comportamento proibido é
enriquecida pelo desvalor social da ação e pelo desvalor do resultado lesando
efetivamente o bem juridicamente protegido, constituindo o que se chama de
tipicidade material. Donde se conclui que o comportamento que se amolda à
determinada descrição típica formal, porém materialmente irrelevante,
adequando-se ao socialmente permitido ou tolerado, não realiza materialmente a
descrição típica.
A respeito do tema, Masson (2011, p. 38,
grifo do autor) ensina ainda que o princípio da adequação social determina que
“não pode ser considerado criminoso o comportamento humano que, embora
tipificado em lei, não afrontar o sentimento
social de Justiça”.
3 - Consequências dogmáticas do princípio da adequação social
Doutrinariamente, não há consenso quanto às
consequências da aplicação do princípio da adequação social. Parte da doutrina
defende que sua incidência afastaria a ilicitude (ou antijuridicidade) do
comportamento. Outra parcela diverge, a sustentar que o substrato do fenômeno
criminoso a ser afastado seria a própria tipicidade. Nesta última corrente é
que se situa o pensamento de Guilherme de Souza Nucci, para o qual a adequação
social constitui-se em excludente supralegal da tipicidade, haja vista não ter
previsão expressa no Código Penal brasileiro.
Com relação à adequação social, pode-se sustentar
que uma conduta aceita e aprovada consensualmente pela sociedade, ainda que não
seja causa de justificação, pode ser considerada não lesiva ao bem jurídico
tutelado.
[...]
Parece-nos que a adequação social é, sem dúvida,
motivo para exclusão da tipicidade, justamente porque a conduta consensualmente
aceita pela sociedade não se ajusta ao modelo legal incriminador, tendo em
vista que este possui, como finalidade precípua, proibir condutas que firam
bens jurídicos tutelados. Ora, se determinada conduta é acolhida como
socialmente adequada deixa de ser considerada lesiva a qualquer bem jurídico,
tornando-se um indiferente penal. (NUCCI, 2011, p. 229-230).
Indo ao encontro da doutrina supracitada, Sérgio
Salomão Shecaira e Alceu Corrêa Junior (apud Nucci,
2011, p. 229) distinguem os princípios penais da adequação social e da
insignificância, aduzindo-os, no plano da dogmática jurídica, como formas
judiciais de descriminalização fática:
Paralelamente à descriminalização legislativa,
assume papel significativo o reconhecimento dos princípios da adequação social
e da insignificância, formas judiciais de descriminalização fática. A adequação
social exclui desde logo a conduta em exame do âmbito de incidência do tipo,
situando-se entre os comportamentos normalmente permitidos, isto é,
materialmente atípicos. [...] O princípio da insignificância, por seu turno,
equivale à desconsideração típica pela não materialização de um prejuízo
efetivo, pela existência de danos de pouquíssima importância.
O estudo do pensamento doutrinal revela, de
maneira inequívoca, a aceitação do princípio da adequação social. Ora
enquadrado como excludente de antijuridicidade, ora como causa supralegal de
exclusão da tipicidade, percebe-se a inclinação doutrinária em afirmar que a
conduta socialmente adequada não realiza materialmente a ação típica descrita
na norma penal.
Logo, a aplicação do princípio da adequação
social constituir-se-ia em uma maneira de afastar a tipicidade de condutas
toleradas pelas sociedade, a autorizar sua descriminalização pela via
jurisdicional que, assim procedendo, favoreceria a aplicação de outro princípio
da dogmática jurídico-penal, isto é, o princípio da intervenção mínima do
Direito Penal.
Entretanto, o Superior Tribunal de Justiça
não tem sido receptivo às teses acadêmicas, a enjeitar em sucessivas
oportunidades a aplicabilidade do princípio da adequação social, como revela a
sua casuística concernente aos crimes de casa de prostituição (CP, art. 229) e violação de direito autoral pelo comércio
de CDs e DVDs piratas (CP, art. 184, § 2º).
4 - Casuística do princípio da adequação social no STJ: casa de
prostituição (CP, art. 229) e comércio de CDs e DVDs piratas (CP, art. 184, §
2º)
No que diz respeito ao princípio da adequação
social, os tribunais brasileiros frequentemente se deparam com a sua invocação em
pelo menos duas hipóteses: casa de prostituição (CP, art. 229) e comércio de
CDs e DVDs piratas (CP, art. 184, § 2º).
Com efeito, discute-se se as condutas de
manter estabelecimento em que ocorra exploração sexual e de vender CDs e DVDs
piratas seriam socialmente adequadas ou não. Nesse sentido, questiona-se: essas
condutas poderiam ser consideradas materialmente atípicas, a afastar,
assim, a tipicidade? Poderiam atrair a prolação de uma sentença favorável
à descriminalização da ação delituosa do réu, até mesmo em grau de absolvição
sumária?
Tais questionamentos foram levados ao
Superior Tribunal de Justiça, a ensejar a formação da sua jurisprudência acerca
do assunto.
Sendo assim, em se tratando da conduta
relativa ao crime de manter casa de prostituição (CP, art. 229), é pacífica a
jurisprudência do STJ quanto à inadmissibilidade da aplicação do princípio da
adequação social para efeito de exclusão da tipicidade material da conduta
incriminada.
Colaciono (grifos meus):
PENAL E PROCESSO PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO
RECURSO ESPECIAL. NEGATIVA DE VIGÊNCIA AO ART. 229 DO CP (REDAÇÃO ANTIGA). CASA DE PROSTITUIÇÃO. DESCRIMINALIZAÇÃO.
INOCORRÊNCIA. TIPICIDADE. REEXAME FÁTICO E PROBATÓRIO. IMPOSSIBILIDADE.
SÚMULA 7/STJ. AGRAVO REGIMENTAL A QUE SE NEGA PROVIMENTO.
1. Esta Corte
Superior tem entendimento no sentido de quen ão se pode falar em
descriminalização pela ordem social do delito de casa de prostituição - artigo
229 do Código Penal.
2. É assente que cabe ao aplicador da lei, em
instância ordinária, fazer um cotejo fático e probatório a fim de analisar a
tipicidade da conduta descrita, sendo vedado a esta Corte revolver o arcabouço
carreado aos autos, ante a vedação do enunciado 7 da Súmula deste Superior
Tribunal de Justiça.
3. Agravo regimental a que se nega provimento.
(STJ, T6 – Sexta Turma, AgRg no REsp 924.750/RS,
Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, j. 15/03/2011, p. DJe 04/04/2011).
RECURSO ESPECIAL. ARTIGO 229 DO CÓDIGO PENAL. PRINCÍPIO DA ADEQUAÇÃO SOCIAL.
INAPLICABILIDADE. TIPICIDADE MATERIAL DA CONDUTA. 1. O princípio da
adequação social é um vetor geral de hermenêutica segundo o qual, dada a
natureza subsidiária e fragmentária do direito penal, se o tipo é um modelo de
conduta proibida, não se pode reputar como criminoso um comportamento
socialmente aceito e tolerado pela sociedade, ainda que formalmente subsumido a
um tipo incriminador. 2. A aplicação deste princípio no exame da tipicidade
deve ser realizada em caráter excepcional, porquanto ao legislador cabe
precipuamente eleger aquelas condutas que serão descriminalizadas. 3. A jurisprudência desta Corte Superior
orienta-se no sentido de que eventual tolerância de parte da sociedade e de
algumas autoridades públicas não implica a atipicidade material da conduta de
manter casa de prostituição, delito que, mesmo após as recentes alterações
legislativas promovidas pela Lei n. 12.015/2009, continuou a ser tipificada no
artigo 229 do Código Penal. 4. De mais a mais, a manutenção de
estabelecimento em que ocorra a exploração sexual de outrem vai de encontro ao
princípio da dignidade da pessoa humana, sendo incabível a conclusão de que é
um comportamento considerado correto por toda a sociedade. 5. Recurso especial
provido para restabelecer a sentença condenatória, apenas em relação ao crime
previsto no artigo 229 do Código Penal.
(STJ, T6 – Sexta Turma, REsp 1435872/MG, Rel. Min. Sebastião
Reis Júnior, Rel. p/ Acórdão Min. Rogério Schietti Cruz, j. 03/06/2014, p. DJe 01/07/2014).
PENAL. PROCESSUAL PENAL. ATIPICIDADE. RUFIANISMO.
ABOLITIO CRIMINIS DO CRIME DO ART. 229. ALTERAÇÃO DA LEI Nº 12.015/09.
SUPRESSÃO DE INSTÂNCIA. ART. 229 DO CP.
PRINCÍPIO DA ADEQUAÇÃO SOCIAL. IMPOSSIBILIDADE. TIPICIDADE. CONFLITO
APARENTE DE NORMAS. PRINCÍPIO DA CONSUNÇÃO. DELITOS DOS ARTS. 229 E 230 DO CP. IMPOSSIBILIDADE.
I - A Primeira Turma do col. Pretório Excelso
firmou orientação no sentido de não admitir a impetração de habeas corpus
substitutivo ante a previsão legal de cabimento de recurso ordinário (v.g.: HC
n. 109.956/PR, Rel. Min. Marco Aurélio, DJe de 11/9/2012; RHC n. 121.399/SP,
Rel. Min. Dias Toffoli, DJe de 1º/8/2014 e RHC n. 117.268/SP, Rel. Min. Rosa
Weber, DJe de 13/5/2014). As Turmas que integram a Terceira Seção desta Corte
alinharam-se a esta dicção, e, desse modo, também passaram a repudiar a
utilização desmedida do writ substitutivo em detrimento do recurso adequado
(v.g.: HC n. 284.176/RJ, Quinta Turma, Rel. Min. Laurita Vaz, DJe de 2/9/2014;
HC n. 297.931/MG, Quinta Turma, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, DJe de
28/8/2014; HC n. 293.528/SP, Sexta Turma, Rel. Min. Nefi Cordeiro, DJe de
4/9/2014 e HC n. 253.802/MG, Sexta Turma, Rel. Min. Maria Thereza de Assis
Moura, DJe de 4/6/2014).
II - Portanto, não se admite mais, perfilhando esse
entendimento, a utilização de habeas corpus substitutivo quando cabível o
recurso próprio, situação que implica o não-conhecimento da impetração. Contudo,
no caso de se verificar configurada flagrante ilegalidade apta a gerar
constrangimento ilegal, recomenda a jurisprudência a concessão da ordem de
ofício.
III - As teses acerca da atipicidade da conduta
prevista no art. 230 do Código Penal pelo princípio da adequação social e da
incidência do instituto do abolitio criminis ao art. 229 do Código Penal não foram
apreciadas pelo eg. Tribunal a quo, não é possível a esta eg. Corte preceder a
tais análises, sob pena de indevida supressão de instância (Precedentes).
IV - A
jurisprudência desta Corte Superior orienta-se no sentido de que eventual
tolerância de parte da sociedade e de algumas autoridades públicas não implica
a atipicidade material da conduta de manter estabelecimento em que ocorra
exploração sexual, delito tipificado no artigo 229 do Código Penal
(Precedentes).
V - O delito de rufianismo não é um mero
exaurimento tampouco está na linha de desdobramento regular do delito
tipificado no art. 229 do CP. Inaplicável, portanto, o princípio da consunção.
VI - In casu,
não merece prosperar a insurgência quanto à dosimetria da pena, uma vez que a
fixação da pena foi fundamentada nas peculiaridades do caso concreto, bem como
na comprovação da reincidência.
Habeas
corpus não conhecido.
(STJ, T5 - Quinta Turma, HC 238.688/RJ, Rel. Min. Félix Fischer,
j. 06/08/2015, p. DJe 19/08/2015).
Idêntico é o entendimento esposado pela Corte,
quando rejeita a tese da atipicidade da conduta de vender CDs e DVDs piratas
com fulcro no princípio da adequação social. É o que se percebe da leitura dos
acórdãos a seguir (grifos meus):
HABEAS CORPUS. VIOLAÇÃO DE DIREITO AUTORAL (ART.
184, § 2º. DO CPB). EXPOSIÇÃO À VENDA DE
287 DVD'S E 230 CD'S PIRATAS. INADMISSIBILIDADE DA TESE DE ATIPICIDADE DA
CONDUTA, POR FORÇA DO PRINCÍPIO DA ADEQUAÇÃO SOCIAL. INCIDÊNCIA DA NORMA PENAL
INCRIMINADORA. PARECER PELA DENEGAÇÃO DA ORDEM. ORDEM DENEGADA.
1. Os pacientes foram surpreendidos por policiais
comercializando, com violação de direito autoral, 287 DVD's e 230 CD's
conhecidos vulgarmente como piratas; ficou constatado, conforme laudo pericial,
que os itens são cópias não autorizadas para comercialização (fls. 182).
2. Mostra-se
inadmissível a tese de que a conduta do paciente é socialmente adequada, pois o
fato de parte da população adquirir tais produtos não tem o condão de impedir a
incidência, diante da conduta praticada, do tipo previsto no art. 184, § 2º. do
CPB; a não aplicação de uma norma penal incriminadora, mesmo que por prolongado
tempo, ou a sua inobservância pela sociedade, não acarretam a sua eliminação do
ordenamento jurídico, por se tratar de comportamento social contra-legem.
3. O prejuízo causado nesses casos não
está vinculado apenas ao valor econômico dos bens apreendidos, mas
deve ser aferido, também, pelo grau de reprovabilidade da conduta, que, nesses
casos, é alto, tendo em vista as consequências nefastas para as artes, a
cultura e a economia do País, conforme amplamente divulgados pelos mais
diversos meios de comunicação. (HC 113.702/RJ, Rel. Min. ARNALDO ESTEVES LIMA,
DJe 03.08.2009 e HC 161.019/SP, Rel. Min. NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, DJe
01.04.2011).
4. Ordem denegada.
(STJ, T5 – Quinta Turma, HC 197.370/MS, Rel. Min.
Napoleão Nunes Maia Filho, j. 03/05/2011, p. DJe 30/05/2011).
HABEAS CORPUS. VIOLAÇÃO DE DIREITO AUTORAL. COMERCIALIZAÇÃO DE DVD'S
"PIRATAS". ALEGADA ATIPICIDADE DA CONDUTA. PRINCÍPIO DA ADEQUAÇÃO
SOCIAL. INAPLICABILIDADE. INCIDÊNCIA DA NORMA PENAL PREVISTA NO ART. 184, §
2º, DO CÓDIGO PENAL.
1. O paciente, em 17.03.06, manteve expostos à
venda 250 (duzentos e cinquenta) DVDs com títulos diversos, reproduzidos com
violação de direitos autorais, com intuito de lucro.
2. A
jurisprudência desta Corte consolidou-se no sentido de que a conduta prevista
no art. 184, § 2º, do Código Penal, é formal e materialmente típica, afastando
a aplicação do princípio da adequação social. Precedentes.
3. A quantidade de mercadorias apreendidas (250
DVDs) demonstra a existência de efetiva lesão ao bem jurídico tutelado pela
norma penal, excluindo a possibilidade de aplicação do princípio da
insignificância.
4. Ordem denegada.
(STJ, T5 – Quinta Turma, HC 175.811/MG, Rel. Min.
Adilson Vieira Macabu (Desembargador convocado do TJ/RJ, j. 12/06/2012, p. DJe
28/06/2012).
AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL. PENAL. VIOLAÇÃO DE DIREITO AUTORAL. ART. 184, §
2º, DO CP. DEPÓSITO. CDS e DVDS. DESNECESSIDADE DE A PEÇA ACUSATÓRIA INFORMAR
O NOME DOS AUTORES DAS OBRAS FRAUDADAS. DENÚNCIA. ADEQUAÇÃO. MATÉRIA
CONSTITUCIONAL. STF.
1. A violação de preceitos, dispositivos ou
princípios constitucionais revela-se quaestio afeta à competência do Supremo Tribunal
Federal, provocado pela via do extraordinário; motivo pelo qual não se pode
conhecer do recurso nesse aspecto, em função do disposto no art. 105, III, da
Constituição Federal.
2. Este Superior Tribunal considera que é afastada
a inépcia quando a denúncia preencher os requisitos do art. 41 do Código de
Processo Penal, com a individualização da conduta do réu, descrição dos fatos e
classificação dos crimes, de forma suficiente para dar início à persecução
penal na via judicial, bem como para o pleno exercício da defesa.
3. A existência de dissídio jurisprudencial notório
autoriza a mitigação das exigências de natureza formal para o conhecimento do recurso
especial, principalmente porque a
jurisprudência deste Superior Tribunal e do Supremo Tribunal Federal se orienta
no sentido de considerar típica, formal e materialmente, a conduta prevista no
art. 184, § 2º, do Código Penal, afastando, assim, a aplicação do princípio da
adequação social, de quem expõe à venda CDs E DVDs "piratas".
4. O agravo
regimental não merece prosperar, porquanto as razões reunidas na insurgência
são incapazes de infirmar o entendimento assentado na decisão agravada.
5. Agravo regimental improvido.
(STJ, T6 – Sexta Turma, AgRg no REsp 1.475.241/MG, Rel.
Min. Sebastião Reis Júnior, j. 16/04/2015, p. DJe 29/04/2015).
Em conclusão: tanto em uma quanto em outra
hipótese (casa de prostituição e mercancia de CDs e DVDs pirateados), o STJ
entende que não se pode falar em descriminalização das condutas pela tolerância
com que a sociedade trata essas práticas criminosas. Portanto, o tribunal não
admite a aplicação do princípio da adequação social, para afastar o
reconhecimento da tipicidade material dessas condutas formalmente típicas.
5 - Inadmissibilidade do
princípio da adequação social no afastamento da tipicidade penal: o precedente
firmado no REsp 1.193.196/MG e a edição do enunciado nº 512 da súmula de
jurisprudência do STJ
O estudo da jurisprudência do STJ tornou clara
que a posição do tribunal superior quanto à inadmissibilidade da aplicação do
princípio da adequação social, com vistas a descaracterizar a tipicidade (material)
das condutas de manter casa de prostituição (CP, art. 229) e violação de
direito autoral pelo comércio de CDs e DVDs piratas (CP, art. 184, § 2º).
Em se tratando dessa última hipótese, dada a
sua recorrência na pauta de julgamentos da Corte, em 2012, a Terceira Seção do
STJ decidiu submeter o julgamento da questão ao rito dos recursos repetitivos
(CPC/73, art. 543-C; CPC/15, art. 1.036). Destacou-se então o REsp 1.193.196/MG,
precedente paradigma, que restou, ao fim e ao cabo, ementado desta maneira:
RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA.
PENAL. OFENSA AO ART. 184, § 2°, DO CP. OCORRÊNCIA. VENDA DE CD'S E DVD'S "PIRATAS". ALEGADA
ATIPICIDADE DA CONDUTA. PRINCÍPIO DA ADEQUAÇÃO SOCIAL. INAPLICABILIDADE.
1. A jurisprudência desta Corte e do Supremo
Tribunal Federal orienta-se no sentido de considerar típica, formal e
materialmente, a conduta prevista no artigo 184, § 2º, do Código Penal,
afastando, assim, a aplicação do princípio da adequação social, de quem expõe à
venda CD'S E DVD'S "piratas".
2. Na hipótese, estando comprovadas a materialidade
e a autoria, afigura-se inviável afastar a consequência penal daí resultante
com suporte no referido princípio.
3. Recurso especial provido. Acórdão sujeito ao
regime do art. 543-C do CPC e da Resolução STJ 08/2008.
(STJ, S3 – Terceira Seção, REsp 1.193.196/MG, Rel.
Min. Maria Thereza de Assis Moura, j. 26/09/2012, p. DJe 04/12/2012).
Após a definição da tese jurisprudencial em
sede de recurso repetitivo (tema 593), no ano seguinte, a Terceira Seção voltou
a reunir-se, ocasião em que deliberou editar um enunciado da súmula de
jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça a respeito do assunto. O
enunciado, que tomou o nº 512, tem esta redação:
STJ, Súmula 502 - Presentes a materialidade e a autoria, afigura-se
típica, em relação ao crime previsto no art. 184, § 2º, do CP, a conduta de
expor à venda CDs e DVDs piratas. (Súmula 502, Terceira Seção, julgado em
23/10/2013, DJe 28/10/2013)
Consagrou-se, assim, na jurisprudência do STJ,
a ratio decidendi que pugna pela inadmissibilidade
do princípio da adequação social como vetor judicial de descriminalização fática.
6 - Conclusão
Herdeira dos ensinamentos do penalista Hans
Welzel, a doutrina brasileira tem forte inclinação em afirmar a plena
aplicabilidade do princípio da adequação social no Direito Penal brasileiro. Como
consequência desse asserto, chegar-se-ia ao resultado segundo o qual o
comportamento socialmente adequado – permitido ou tolerado – seria materialmente
irrelevante, a despeito de sua previsão formal como ação típica. Finalmente, ter-se-ia
de admitir que condutas socialmente irrelevantes não realizam materialmente o
fato típico e, portanto, não podem ser sancionadas pelo Direito Penal da
intervenção mínima.
Esse é um pensamento moderno, vanguardista,
mas que, lamentavelmente, não foi acompanhado pela jurisprudência do Superior
Tribunal de Justiça.
Desconsiderando questões sociais
indispensáveis à análise do fenômeno jurídico, a Terceira Seção do tribunal sedimentou
entendimento que defende a inaplicabilidade do princípio da adequação social
aos delitos descritos nos arts. 229 (Casa de prostituição) e 184, § 2º (comercialização
de CDs e DVDs falsificados), do Código Penal.
Na hipótese da venda de CDs e DVDs piratas, a
tese que defendia a atipicidade da conduta não prosperou, o que ficou evidente
já no julgamento do REsp 1.193.196/MG (tema 593 dos recursos repetitivos).
Nesse precedente, ficou assentado que é típica, formal e materialmente, a
conduta prevista no art. 184, § 2º, do CP, motivo pelo qual fica afastada a
aplicação do princípio da adequação social - como vetor de descriminalização judicial
fática - aos acusados pela prática desse delito. De modo a ratificar essa tese,
editou-se o enunciado nº 512 da sua súmula de jurisprudência.
Com isso, o Superior Tribunal de Justiça
terminou por agarrar-se a uma concepção de formalista do fato típico, a impedir
que o julgador, à luz das circunstâncias do caso concreto, de sopesar se a
conduta de vender ou expor à venda CDs e DVDs piratas lesiona, de fato, o bem
jurídico tutelado, a realizar materialmente a conduta descrita na norma penal
incriminadora.
A afastar-se dessa orientação doutrinária, ao
menos no que concerne aos crimes de casa de prostituição e comércio de CDs e
DVDs piratas, o STJ interpreta a dogmática penal de maneira engessada. Para o
tribunal, somente o legislador, por razões de política criminal, está
autorizado a editar lei que descriminalize as condutas descritas nos tipos dos arts.
229 e art. 184, § 2º, do Código Penal. Dessa forma, enquanto não for promulgada
lei nesse sentido, não se admite judicialmente o uso argumentativo de tolerância
social ou desuso da regra com o escopo descriminador dessas condutas.
REFERÊNCIAS
BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de
Direito Penal: parte geral, volume 1. 8ª ed. São Paulo: Saraiva, 2003.
748 f.
BRASIL. Código Penal. Decreto-Lei 2.848, de 7
de dezembro de 1940. Disponível em: www.planalto.gov.br.
Acesso em: 29 de ago. 2015.
BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. T6 – Sexta
Turma, AgRg no REsp 924.750/RS, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, j.
15/03/2011, p. DJe 04/04/2011. Disponível em: www.stj.jus.br. Acesso em: 29 de ago. 2015.
BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. T5 – Quinta
Turma, HC 197.370/MS, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, j. 03/05/2011, p.
DJe 30/05/2011. Disponível em: www.stj.jus.br.
Acesso em: 29 de ago. 2015.
BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. T5 – Quinta
Turma, HC 175.811/MG, Rel. Min. Adilson Vieira Macabu (Desembargador convocado
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BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. S3 – Terceira
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