Min. Maria de Assis Calsing, relatora do AI no RR 1191-13.2011.5.04.0017 no TST |
Ouvindo atualmente: "Konzert für Violine und Orchester:
Dem Andeken eines Engels" (1935) de Alban Berg (gravação
da Filarmônica de Nova York, sob a regência de Lorin Maazel,
com a violinista Anne-Sophie Mutter como solista).
Só existe uma maneira de apreciar a música atonal:
conhecer profundamente a Teoria Musical.
Talvez por isso a música de Alban Berg agrade a tão poucos... Mas eu adoro!
conhecer profundamente a Teoria Musical.
Talvez por isso a música de Alban Berg agrade a tão poucos... Mas eu adoro!
Tema polêmico por excelência, até pela
precarização dos direitos do trabalhador que acarreta, a terceirização das
relações de trabalho tornou a ser objeto de debate recente no TST.
Naturalmente, a discussão envolveu a aplicabilidade do enunciado nº 331 da súmula
da Corte Trabalhista. Como inexiste lei a regulamentar especificamente a
matéria, a jurisprudência tem sido utilizada como ferramenta para balizar o
fenômeno das terceirizações trabalhistas.
Sendo assim, cumpre observar o
inteiro teor do entendimento jurisprudencial consagrado para efeito de regência da matéria no Brasil:
Súmula
nº 331 do TST
CONTRATO
DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS. LEGALIDADE (nova redação do item IV e inseridos os
itens V e VI à redação) - Res. 174/2011, DEJT divulgado em 27, 30 e 31.05.2011
I
- A contratação de trabalhadores por empresa interposta é ilegal, formando-se o
vínculo diretamente com o tomador dos serviços, salvo no caso de trabalho
temporário (Lei nº 6.019, de 03.01.1974).
II
- A contratação irregular de trabalhador, mediante empresa interposta, não gera
vínculo de emprego com os órgãos da Administração Pública direta, indireta ou
fundacional (art. 37, II, da CF/1988).
III
- Não forma vínculo de emprego com o tomador a contratação de serviços de
vigilância (Lei nº 7.102, de 20.06.1983) e de conservação e limpeza, bem como a
de serviços especializados ligados à atividade-meio do tomador, desde que
inexistente a pessoalidade e a subordinação direta.
IV
- O inadimplemento das obrigações trabalhistas, por parte do empregador,
implica a responsabilidade subsidiária do tomador dos serviços quanto àquelas
obrigações, desde que haja participado da relação processual e conste também do
título executivo judicial.
V
- Os entes integrantes da Administração Pública direta e indireta respondem
subsidiariamente, nas mesmas condições do item IV, caso evidenciada a sua
conduta culposa no cumprimento das obrigações da Lei n.º 8.666, de 21.06.1993,
especialmente na fiscalização do cumprimento das obrigações contratuais e
legais da prestadora de serviço como empregadora. A aludida responsabilidade
não decorre de mero inadimplemento das obrigações trabalhistas assumidas pela
empresa regularmente contratada.
VI
– A responsabilidade subsidiária do tomador de serviços abrange todas as verbas
decorrentes da condenação referentes ao período da prestação laboral.
Não resta dúvida de que, considerando toda a súmula de jurisprudência do TST, o enunciado nº 331 é o que tem rendido os debates doutrinários mais acirrados. Em grande parte,
porque houve, por parte dos representantes da Fazenda Pública, a conhecida discordância quanto à interpretação que o
Tribunal Superior do Trabalho conferia ao art. 71, § 1º, da Lei 8.666/93. Reproduzo o preceito in verbis:
Art. 71. O
contratado é responsável pelos encargos trabalhistas, previdenciários, fiscais
e comerciais resultantes da execução do contrato.
§ 1º A
inadimplência do contratado, com referência aos encargos trabalhistas, fiscais
e comerciais não transfere à Administração Pública a responsabilidade por seu
pagamento, nem poderá onerar o objeto do contrato ou restringir a regularização
e o uso das obras e edificações, inclusive perante o Registro de Imóveis.
No entanto, as divergências doutrinárias e pretorianas acerca da duvidosa
constitucionalidade do § 1º do art. 71 da Lei 8.666/93 foram definitivamente afastadas com a decisão do STF prolatada na ADC 16. Nesse julgado, a Suprema Corte brasileira reconheceu a validade do dispositivo. Eis a
ementa do precedente:
RESPONSABILIDADE
CONTRATUAL. Subsidiária. Contrato com a administração pública. Inadimplência
negocial do outro contraente. Transferência consequente e automática dos seus
encargos trabalhistas, fiscais e comerciais, resultantes da execução do
contrato, à administração. Impossibilidade jurídica. Consequência proibida pelo
art., 71, § 1º, da Lei federal nº 8.666/93. Constitucionalidade reconhecida
dessa norma. Ação direta de constitucionalidade julgada, nesse sentido,
procedente. Voto vencido. É constitucional a norma inscrita no art. 71, § 1º,
da Lei federal nº 8.666, de 26 de junho de 1993, com a redação dada pela Lei nº
9.032, de 1995. (STF
- ADC: 16 DF , Relator: Min. CEZAR PELUSO, Data de Julgamento: 24/11/2010,
Tribunal Pleno, Data de Publicação: DJe-173 DIVULG 08-09-2011 PUBLIC 09-09-2011
EMENT VOL-02583-01 PP-00001)
Ou seja, relativamente aos encargos trabalhistas inadimplidos pela empresa contratada, o STF entendeu que a
responsabilidade da Administração Pública não é automática. É preciso demonstrar a
conduta culposa (culpa “in vigilando”) do ente público, que não cuida de
acompanhar e fiscalizar o cumprimento das obrigações legais atinentes à
execução do contrato firmado com a empresa prestadora de serviços.
Logicamente a decisão do STF influiu na nova
redação dada ao enunciado nº 331 da súmula do TST. Agora, o texto sumulado é
explícito quanto à necessidade de se comprovar a conduta culposa do ente
público que se pretende responsabilizar pelas obrigações de caráter trabalhista
não adimplidas pelo empregador.
Nesse prisma, guia-se a jurisprudência
recente do TST (grifos meus):
AGRAVO
DE INSTRUMENTO. RITO SUMARÍSSIMO. RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA. ENTE INTEGRANTE
DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA INDIRETA. TOMADOR DE SERVIÇOS. SÚMULA N.º 331, V, DO
TST. COMPROVAÇÃO DA CULPA -IN VIGILANDO- NECESSIDADE. AGRAVO DE INSTRUMENTO.
RITO SUMARÍSSIMO. RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA. ENTE INTEGRANTE DA
ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA INDIRETA. TOMADOR DE SERVIÇOS. SÚMULA N.º 331, V, DO TST.
COMPROVAÇÃO DA CULPA -IN VIGILANDO-. NECESSIDADE. Não comprovada a culpa -in
vigilando- da entidade pública, a decisão proferida pelo Regional contraria a
jurisprudência pacífica desta Corte, consagrada no antigo item IV e atual item
V da Súmula n.º 331. Agravo de Instrumento conhecido e provido . RECURSO DE
REVISTA. RITO SUMARÍSSIMO. RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA. ENTE INTEGRANTE DA
ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA INDIRETA. TOMADOR DE SERVIÇOS. SÚMULA N.º 331, V, DO TST.
COMPROVAÇÃO DA CULPA -IN VIGILANDO-. NECESSIDADE . De acordo com a nova redação
conferida à Súmula n.º 331 do TST, os entes integrantes da Administração
Pública direta e indireta respondem subsidiariamente, nas mesmas condições do
item IV, caso evidenciada a sua conduta culposa no cumprimento das obrigações
da Lei n.º 8.666/93; a aludida responsabilidade não decorre de mero
inadimplemento das obrigações trabalhistas assumidas pela empresa regularmente
contratada. Ora, não havendo comprovação da inobservância do dever de
acompanhar e fiscalizar a execução dos contratos promovidos com a prestadora de
serviços (arts. 58, III, 67 e 70 da Lei n.º 8.666/93), não há de se falar em
negligência, nem responsabilidade subsidiária da Administração Pública. Recurso
de Revista conhecido e provido. (TST
- RR: 7106320115050133 710-63.2011.5.05.0133, Relator: Maria de Assis
Calsing, Data de Julgamento: 22/05/2013, 4ª Turma, Data de Publicação: DEJT
24/05/2013)
Mas o que fazer quando a Administração
Pública não celebrou propriamente um contrato de terceirização, mas sim
cometeu à pessoa jurídica, por meio de convênio, serviço típico da atuação
estatal?
Foi essa interrogação que a Quarta Turma do
TST procurou responder ao julgar o recente AIRR-1191-13.2011.5.04.0017. No caso
concreto, uma atendente de creche prestava serviços à sociedade beneficente que
fora contratada pelo município de Porto Alegre (RS). Após ser despedida, a
empregada ajuizou reclamação, a fim de pleitear o pagamento de verbas
rescisórias decorrentes do rompimento do vínculo empregatício. As alegações da
obreira informavam que, embora contratada formalmente pela sociedade
beneficente mantenedora da creche "Palhaço Feliz", na verdade, prestava serviços
de educação infantil ao ente público municipal.
Como as decisões de primeiro e segundo graus
condenaram o município reclamado ao pagamento das verbas rescisórias, o caso
foi levado ao TST. Então, mediante o julgamento do agravo de instrumento
interposto em recurso de revista, a Quarta Turma da Corte Superior Trabalhista
consignou um importante discrime: o ente público que firma convênio com
outra pessoa jurídica para prestação de serviços na área de educação deve
responder subsidiariamente por eventuais obrigações trabalhistas não assumidas
pelo empregador.
Vejamos como ficou ementada a decisão:
EMENTA: AGRAVO DE INSTRUMENTO. RECURSO DE REVISTA. CONVÊNIO DE PRESTAÇÃO DE
SERVIÇOS PÚBLICOS EM EDUCAÇÃO. RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA DO
MUNICÍPIO. SÚMULA Nº 331 DO TRIBUNAL SUPERIOR DO TRABALHO.
1. Educação
é dever primacial do Estado (Constituição Federal, art. 205).
2. Se
o ente público (Município) louva-se de convênio com outra pessoa jurídica para
a prestação de serviços na área de educação, suporta responsabilidade
subsidiária em caso de inadimplemento das obrigações trabalhistas assumidas
pelo empregador.
3. Conquanto
não haja propriamente terceirização de serviços e, sim, contratação direta para
prestação de serviços diretamente ao ente conveniado, em realidade o ente
público é o beneficiário direto e indireto de um serviço tipicamente estatal
cuja execução transfere injustificadamente a outrem. Inteligência da Súmula nº
331, itens IV a VI, do Tribunal Superior do Trabalho.
4. Agravo
de instrumento de que se conhece e a que se nega provimento.
(TST
- RR: AIRR-1191-13.2011.5.04.0017, Relator: Maria de Assis Calsing, Data de
Julgamento: 22/05/2013, 4ª Turma, Data de Publicação: DEJT 24/05/2013)
Note o leitor o que o fundamento principal do
discrime operado partiu do reconhecimento de que assegurar o direito à educação
é dever do Estado, tal qual prevê a Constituição no seu art. 205:
Art.
205. A educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será
promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno
desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua
qualificação para o trabalho.
Com base nessa premissa, e à luz do inc. III
do enunciado nº 331, os julgadores do TST afastaram a hipótese de
terceirização, que ocorre quando o tomador de serviços promove a transferência
de atividade-meio, cujo exercício fica sob a incumbência de empresa
distinta e especializada (conhecida comumente como "empresa terceirizada"). Segundo
entendimento prevalente na Quarta Turma, o que se transferiu no caso concreto da creche porto-alegrense não foi
atividade-meio, e sim atividade-fim (serviço educacional), visto que típico
dever do Estado. Logo, restou descaracterizado o fenômeno da terceirização.
Entretanto, não obstante não tenha havido
terceirização, mas sim contratação direta de serviços educacionais com o ente
conveniado, a natureza do vínculo que une a pessoa jurídica mantenedora da
creche ao município de Porto Alegre não obsta o reconhecimento da
responsabilidade subsidiária da Fazenda Pública municipal pelo inadimplemento
das obrigações trabalhistas assumidas pelo empregador. Mas é preciso respeitar a imprescindibilidade de comprovação da culpa in vigilando do ente público, porquanto, ao fim e ao cabo, não deixa de ser hipótese de responsabilidade subsidiária da Administração Pública.
Eis aí, então, um bom discrime jurisprudencial quanto à responsabilidade dos entes públicos nos contratos celebrados com outras pessoas jurídicas sob o regime de convênio. Apesar disso, é fato que o enunciado nº 331 da súmula de jurisprudência do Tribunal
Superior do Trabalho permanece muito distante de esgotar todas as dúvidas que circundam o fenômeno de terceirização trabalhista.
REFERÊNCIAS
BRASIL. Supremo Tribunal Federal. ADC 16/DF,
Tribunal Pleno, Rel. Min. Cezar Peluso, j. 24/11/2010, p. DJe 09/09/2011.
Disponível em: www.stf.jus.br.
Acesso em: 23 de fev. 2014.
BRASIL. Tribunal Superior do Trabalho. Súmula de jurisprudência, enunciado nº
331 (Contrato de prestação de serviços. Legalidade). DEJT 27, 30 e 31.05.2011. Disponível em: www.tst.jus.br.
Acesso em: 23 de fev. 2014.
BRASIL. Tribunal Superior do Trabalho. Quarta Turma. Recurso de Revista 710-63.2011.5.05.0133, Rel. Min. Maria de Assis Calsing, j. 22/05/2013, p. DEJT 24/05/2013. Disponível em: www.tst.jus.br. Acesso em: 23 de fev. 2014.
BRASIL. Tribunal Superior do Trabalho. Quarta Turma. Agravo de Instrumento no Recurso de Revista 1191-13.2011.5.04.0017, Rel. Min. Maria de Assis Calsing, j. 22/05/2013, p. DEJT 24/05/2013. Disponível em: www.tst.jus.br. Acesso em: 23 de fev. 2014.
BRASIL. Constituição da República Federativa
do Brasil, de 5 de outubro de 1988. Disponível em: www.planalto.gov.br. Acesso em: 23 de fev. 20124
BRASIL. Lei 8.666, de 21 de
junho de 1993. Disponível em: www.planalto.gov.br.
Acesso em: 23 de fev. 2014.
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