domingo, 27 de março de 2016

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sábado, 26 de março de 2016

Comentários às normas fundamentais do Código de Processo Civil de 2015 (arts. 1º a 12)

 
Assistindo atualmente: DVD "A Russian Night: Rachmaninov, Tchaikovsky, Stravinsky", concerto gravado em 2008 no Festival de Lucerna (Suíça), com a regência de Claudio Abbado e participação de Hèléne Grimaud (solista).



O antigo Código de Processo Civil brasileiro, de 1973, editado no tempo autoritário da ditadura militar, evidentemente não se preocupava com os direitos fundamentais. Por isso, seu texto principiava diretamente com as normas relativas à jurisdição e à ação. O projeto original do CPC-1973 não tecia considerações sistemáticas sobre a relação entre Constituição e processo, ou entre direitos fundamentais e processo, até porque, sob o espectro de um Estado ditatorial de exceção, o Direito Constitucional, como o Estado de Direito, vale muito pouco.  

A mudar por completo essa perspectiva, o Código de Processo Civil de 2015 (Lei 13.105/15) nasce como o primeiro código brasileiro integralmente elaborado e aprovado sob a égide da Constituição de 1988, que elegeu o modelo de Estado Democrático de Direito (art. 1º). Assim, o CPC-2015, coerente com esse novo paradigma de Estado Constitucional, abre o texto codificado com um corpo de dispositivos (arts. 1º a 12) que preveem normas de direitos fundamentais aplicadas ao Processo Civil. 

Boa parte dessas normas decorre ora da reprodução quase literal de um comando constitucional (CPC, art. 3º), ora da criação de regras voltadas à concretização de direitos fundamentais constantes do catálogo do art. 5º da CF/88. 

De modo sucinto, dedicar-me-ei a comentar as normas fundamentais do Processo Civil no novo Código, que são aquelas que vão do art. 1º ao art. 12, a relacioná-las às normas constitucionais de direitos fundamentais à luz da Constituição de 1988.

CPC, art. 1º O processo civil será ordenado, disciplinado e interpretado conforme os valores e as normas fundamentais estabelecidos na Constituição da República Federativa do Brasil, observando-se as disposições deste Código.
 
► CPC-15, art. 1º: o texto do artigo explicita claramente que todo o Direito Processual Civil deve submeter-se a uma indispensável filtragem constitucional. Essa filtragem da legislação subalterna remete a uma das características mais importantes do pensamento jurídico contemporâneo (neoconstitucionalismo), a saber, a valorização da força normativa da Constituição, que não pode servir apenas como um conjunto de promessas grandiloquentes, mas deve orientar não só a elaboração das leis como toda a atividade interpretativa (ao intérprete não é dado decidir “conforme sua consciência” ou com base no seu “livre convencimento motivado”; sob o império da Constituição, o convencimento não é livre, mas sim condicionado aprioristicamente pelas normas constitucionais).  
 
CPC, art. 2º: O processo começa por iniciativa da parte e se desenvolve por impulso oficial, salvo as exceções previstas em lei.
 
     ► CPC-15, art. 2º: trata-se de norma fundamental do processo que está a consagrar o chamado “princípio da demanda”. Esse princípio impõe às partes o dever de provocar a atuação do Estado-juiz, em face da inércia que caracteriza a jurisdição (o Poder Judiciário não tem poder de iniciativa, não pode começar uma demanda, ainda que o direito seja indisponível). Somente quando provocado é que o Estado-juiz intervirá para o fim de dizer o direito, aplicando-o ao caso concreto. Pela mesma razão de inércia jurisdicional é que o julgador deve ficar adstrito a julgar nos limites do pedido (elemento objetivo da demanda). Apesar disso, a lei ressalva que, uma vez provocado, o Poder Judiciário está autorizado a impulsionar o processo (impulso oficial), a praticar os atos processuais necessários que contribuam para a resolução do mérito da demanda, de maneira a garantir às partes o acesso a uma ordem jurídica efetiva, que é aquela que não demora injustificadamente, mas que produz uma decisão judicial em tempo razoável.
 
CF, art. 5º, XXXV - a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito;
CF, art. 5º: LXXVIII - a todos, no âmbito judicial e administrativo, são assegurados a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação.
CPC, art. 3º: Não se excluirá da apreciação jurisdicional ameaça ou lesão a direito.
§ 1º É permitida a arbitragem, na forma da lei.
§ 2º O Estado promoverá, sempre que possível, a solução consensual dos conflitos.
§ 3º A conciliação, a mediação e outros métodos de solução consensual de conflitos deverão ser estimulados por juízes, advogados, defensores públicos e membros do Ministério Público, inclusive no curso do processo judicial.
 
► CPC-15, art. 3º: o caput do dispositivo é quase que uma reprodução literal do princípio constitucional da inafastabilidade de jurisdição (CF, art. 5º, XXXV), que, de acordo com uma leitura doutrinária moderna, não se satisfaz apenas com a garantia formal de acesso ao Poder Judiciário, mas incorpora uma dimensão material, no que resulta que a inafastabilidade garante o acesso à ordem jurídica justa, considerando-se justa a ordem jurídica que assegura ao jurisdicionado uma prestação jurisdicional efetiva, adequada e, sobretudo, em tempo razoável (CF, art. 5º, LXXVIII).
 
CPC, art. 4º: As partes têm o direito de obter em prazo razoável a solução integral do mérito, incluída a atividade satisfativa.
 
► CPC-15, art. 4º: o dispositivo prevê o direito fundamental à razoável duração do processo associado a outro princípio processual, qual seja, o princípio da primazia da decisão de mérito (para uma análise mais detalhada desse princípio, recomendo outro texto no blogue: http://gertconcursos.blogspot.com.br/2016/02/rt-comenta-processo-civil-principio-da.html).
 
CF, art. 5º, LIV - ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal;
CPC, art. 5º Aquele que de qualquer forma participa do processo deve comportar-se de acordo com a boa-fé.    
 
► CPC-15, art. 5º: estabelece o princípio da boa-fé (cláusula geral da boa-fé processual), aplicável a todos os sujeitos participantes do processo (Juiz, Ministério Público, partes, representantes das partes, incluindo a Defensoria Pública, terceiros intervenientes etc.). Significa dizer que todo e qualquer sujeito, dentro do processo, deve comportar-se de maneira honesta, proba, ética. Consequentemente, a conduta de má-fé no processo é objeto de censura, devendo, à luz do princípio da boa-fé, ser considerada ilícita. O fundamento constitucional da boa-fé objetiva na lei decorre do raciocínio seguinte: não pode haver devido processo legal (CF, art. 5º, LIV), quando as partes litigantes agem no processo com abuso do seu direito, o que é o mesmo que não colaborar com a prestação jurisdicional.   

 CPC, art. 6º: Todos os sujeitos do processo devem cooperar entre si para que se obtenha, em tempo razoável, decisão de mérito justa e efetiva. 
 
► CPC-15, art. 6º: outro dispositivo que visa a dar um sentido ético ao processo. Posto que não se possa exigir que partes litigantes venham a transigir quanto aos seus direitos respectivos, a lei processual civil fixa o princípio da cooperação processual, no sentido de que todos os sujeitos do processo devem cooperar entre si, de boa-fé, para a formação da decisão de mérito que satisfaz o acesso a uma ordem jurídica justa (CF, art. 5º, XXXV), em tempo razoável (CF, art. 5º, LXXVIII), a consubstanciar o devido processo legal (CF, art. 5º, LIV). Na prática, o dever de cooperação materializa-se para o juiz (p. ex.: ao determinar a emenda da petição inicial, o juiz esclarece ao demandante aquilo que está a merecer reparo) como para as partes (um simples comparecimento injustificado em juízo, para audiência previamente designada e da qual todos tenham sido cientificados em tempo hábil, já está a revelar uma falta de cooperação).
CF, art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
I - homens e mulheres são iguais em direitos e obrigações, nos termos desta Constituição;
CPC, art. 7º: É assegurada às partes paridade de tratamento em relação ao exercício de direitos e faculdades processuais, aos meios de defesa, aos ônus, aos deveres e à aplicação de sanções processuais, competindo ao juiz zelar pelo efetivo contraditório.
 
► CPC-15, art. 7º: é impossível pensar na garantia do devido processo legal (CF, art. 5º, LV) sem que haja igualdade entre as partes no processo. A isonomia processual pretendida operacionaliza-se mediante a garantia de paridade de armas, isto é, durante todo o curso do procedimento, cabe ao juiz assegurar às partes um tratamento igualitário/paritário (mesmas faculdades, mesmos poderes, mesmos prazos, mesmas oportunidades de falar nos autos, mesmos deveres, mesmos ônus). Nesse sentido, pode-se corretamente afirmar que a paridade de armas no processo decorre diretamente do princípio constitucional da igualdade (CF, art. 5º, I).  
 
CF, art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos:
(...)
III - a dignidade da pessoa humana;
 
CF, art. 93, IX: todos os julgamentos dos órgãos do Poder Judiciário serão públicos, e fundamentadas todas as decisões, sob pena de nulidade, podendo a lei limitar a presença, em determinados atos, às próprias partes e a seus advogados, ou somente a estes, em casos nos quais a preservação do direito à intimidade do interessado no sigilo não prejudique o interesse público à informação;       
LINDB, art. 5º  Na aplicação da lei, o juiz atenderá aos fins sociais a que ela se dirige e às exigências do bem comum.
CPC, art. 8º: Ao aplicar o ordenamento jurídico, o juiz atenderá aos fins sociais e às exigências do bem comum, resguardando e promovendo a dignidade da pessoa humana e observando a proporcionalidade, a razoabilidade, a legalidade, a publicidade e a eficiência.
 
► CPC-15, art. 8º: eis um dispositivo que consagra uma cláusula aberta de caráter hermenêutico no processo civil, em muito influenciada pela Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro - LINDB (art. 5º). Mas essa cláusula vem impregnada de importantes diretrizes constitucionais. A primeira resulta do próprio modelo de Estado de Direito, que impede decisões baseadas no puro arbítrio dos juízes, decisões que, portanto, não se harmonizem com a proporcionalidade, com a razoabilidade, com a legalidade. A exigência de publicidade é outra garantia do Estado de Direito contra condutas abusivas, na medida em que permite o controle do fundamento das decisões judiciais (CF, art. 93, IX). Finalmente, temos o anteparo do princípio constitucional da dignidade da pessoa humana (CF, art. 1º, III), já que não é possível conceber o acesso à ordem jurídica justa sem que haja o respeito aos direitos fundamentais no curso do processo.
 
CF, art. 5º, LV - aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes;
 
Art. 9º Não se proferirá decisão contra uma das partes sem que ela seja previamente ouvida.
Parágrafo único.  O disposto no caput não se aplica:
I - à tutela provisória de urgência;
II - às hipóteses de tutela da evidência previstas no art. 311, incisos II e III;
III - à decisão prevista no art. 701.
 
► CPC-15, art. 9º: o dispositivo consagra uma regra que concretiza o princípio constitucional do contraditório (CF, art. 5º, LV). Significa dizer que, no curso do processo, é imperioso observar o direito de a parte ser ouvida, pois só assim se estará a oportunizar a alguém a produção de sua ampla defesa. Em outras palavras, os direitos das partes não podem ser atingidos sem que elas tenham tido a oportunidade de se manifestar nos autos acerca deles. É como se o legislador quisesse estampar nesse art. 9º, de maneira inequívoca, que a participação das partes na formação do contraditório deve ser ativa em todo os atos do processo, a afastar, desse modo, a ideia de um processo unilateral, no qual a decisão seja produto da atuação de uma única parte. Tampouco se quer, pela letra desse dispositivo, permitir que o contraditório configure um princípio puramente formal, mas sim que decorra da oportunidade concreta de a parte deduzir suas razões no curso do procedimento, a colaborar para a construção do provimento final. Obviamente, como os direitos fundamentais não são absolutos, os inc. I a III do parágrafo único do art. 9º estão a excepcionar a garantia do contraditório prévio. Mas a exceção não anula o princípio, visto que o contraditório fica postergado (em um momento posterior, garantir-se-á à parte a oportunidade de se manifestar), razão pela qual a garantia do devido processo legal fica preservada.
 
CPC, art. 10.  O juiz não pode decidir, em grau algum de jurisdição, com base em fundamento a respeito do qual não se tenha dado às partes oportunidade de se manifestar, ainda que se trate de matéria sobre a qual deva decidir de ofício.
 
CPC, art. 493.  Se, depois da propositura da ação, algum fato constitutivo, modificativo ou extintivo do direito influir no julgamento do mérito, caberá ao juiz tomá-lo em consideração, de ofício ou a requerimento da parte, no momento de proferir a decisão.
Parágrafo único.  Se constatar de ofício o fato novo, o juiz ouvirá as partes sobre ele antes de decidir.
 
► CPC-15, art. 10: outro dispositivo que denota a influência do princípio constitucional do contraditório e da ampla defesa (CF, art. 5º, LV) na formação do devido processo legal. Quase como uma extensão das razões norteadoras do art. 9º, o art. 10 cuidou de proibir o “efeito surpresa” nas decisões judiciais. Com efeito, o que o legislador deseja é impedir que qualquer das partes venha a ser surpreendida com uma decisão que, ao tratar do seu respectivo direito, tenha se fundamentado em ponto a respeito do qual não houve debate e, portanto, não houve procedimento em contraditório e a produção da ampla defesa. Por exemplo: se surgir um “fato novo” no curso da instrução, como o juiz deve proceder? À luz do art. 10, a postura do magistrado deve, em respeito ao contraditório, ouvir as partes sobre o fato novo, antes de tomar qualquer decisão a respeito (CPC, art. 493, parágrafo único). Esse comando do art. 10 é tão forte que nem mesmo a matéria cognoscível de ofício é capaz de excepcioná-lo; na mesma toada, a proibição do “efeito-surpresa” (fundamento a respeito do qual não se tenha dado às partes oportunidade de se manifestar) vale para todos os graus de jurisdição.    
 
CF, art. 93, IX: todos os julgamentos dos órgãos do Poder Judiciário serão públicos, e fundamentadas todas as decisões, sob pena de nulidade, podendo a lei limitar a presença, em determinados atos, às próprias partes e a seus advogados, ou somente a estes, em casos nos quais a preservação do direito à intimidade do interessado no sigilo não prejudique o interesse público à informação;       
Art. 11.  Todos os julgamentos dos órgãos do Poder Judiciário serão públicos, e fundamentadas todas as decisões, sob pena de nulidade.
Parágrafo único.  Nos casos de segredo de justiça, pode ser autorizada a presença somente das partes, de seus advogados, de defensores públicos ou do Ministério Público.
 
► CPC-15, art. 11: dispositivo que concretiza, no corpo do código, o princípio constitucional da publicidade e o dever de fundamentação (motivação) das decisões judiciais (CF, art. 93, IX). A lei processual civil, tal como a Constituição, comina de nulidade a falta de publicidade e motivação, porquanto esses elementos consubstanciam a garantia do devido processo legal (CF, art. 5º, LV), já que não se pode conceber a ampla defesa dissociada da exigência de imparcialidade e independência do julgador. Pelos deveres correlatos de publicidade e motivação das decisões judiciais, garante-se à sociedade a confiança nos órgãos do Poder Judiciário, que assim submetem suas decisões ao crivo dos jurisdicionados (no sentido mais comezinho de respeito à ordem jurídica e à Constituição, afastada a ideia do juiz “livre” para decidir “conforme a sua consciência”). A imposição aos juízes do dever de fundamentarem suas decisões também vai ao encontro do princípio constitucional do contraditório, uma vez que permite o controle desses fundamentos, que não podem ser “fundamentos-surpresa”, mas devem ter sido extraídos da efetiva contribuição das partes no curso do procedimento. Por essas mesmas razões, são inválidas as decisões judiciais sem fundamentação ou com fundamentação deficiente.
 
Art. 12.  Os juízes e os tribunais atenderão, preferencialmente, à ordem cronológica de conclusão para proferir sentença ou acórdão.  
§ 1º A lista de processos aptos a julgamento deverá estar permanentemente à disposição para consulta pública em cartório e na rede mundial de computadores.
§ 2º Estão excluídos da regra do caput:
I - as sentenças proferidas em audiência, homologatórias de acordo ou de improcedência liminar do pedido;
II - o julgamento de processos em bloco para aplicação de tese jurídica firmada em julgamento de casos repetitivos;
III - o julgamento de recursos repetitivos ou de incidente de resolução de demandas repetitivas;
IV - as decisões proferidas com base nos arts. 485 e 932;
V - o julgamento de embargos de declaração;
VI - o julgamento de agravo interno;
VII - as preferências legais e as metas estabelecidas pelo Conselho Nacional de Justiça;
VIII - os processos criminais, nos órgãos jurisdicionais que tenham competência penal;
IX - a causa que exija urgência no julgamento, assim reconhecida por decisão fundamentada.
§ 3º Após elaboração de lista própria, respeitar-se-á a ordem cronológica das conclusões entre as preferências legais.
§ 4º Após a inclusão do processo na lista de que trata o § 1º, o requerimento formulado pela parte não altera a ordem cronológica para a decisão, exceto quando implicar a reabertura da instrução ou a conversão do julgamento em diligência.
§ 5º Decidido o requerimento previsto no § 4º, o processo retornará à mesma posição em que anteriormente se encontrava na lista.
§ 6º Ocupará o primeiro lugar na lista prevista no § 1º ou, conforme o caso, no § 3º, o processo que:
I - tiver sua sentença ou acórdão anulado, salvo quando houver necessidade de realização de diligência ou de complementação da instrução;
II - se enquadrar na hipótese do art. 1.040, inciso II.
 
► CPC-15, art. 12: o caput do dispositivo já carrega a alteração promovida pela Lei 13.256/16, que substituiu a ideia de obrigatoriedade da redação original (“deverão obedecer”) pela ideia de sugestão (“preferencialmente”) de obediência à ordem cronológica nos julgamentos. O art. 12 é outra das normas subalternas que visam a criar mecanismos processuais que sejam aptos a preservar o direito fundamental à razoável duração do processo (CF, art. 5º, LXXVIII). Nota-se nos parágrafos desse dispositivo uma preocupação de caráter estritamente pragmático com a ordem de julgamento dos processos pelos juízes e tribunais, preferindo-se o critério cronológico ante a constatação óbvia de que os processos que estão há muito tempo a aguardar uma resolução colocam em risco a garantia da inafastabilidade de jurisdição (CF, art. 5º, XXXV), aqui concebido como o direito de acesso à ordem jurídica justa, que é aquela capaz de prover a tutela jurisdicional efetiva e em tempo razoável.       

 

quinta-feira, 17 de março de 2016

RT COMENTA: DIREITO CIVIL - Contratos em espécie (Contrato de seguro)



1 – Pergunta enviada pelo leitor:

No contrato de seguro, a participação em "racha" implica a perda da cobertura contratada?

O risco é elemento básico da relação contratual securitária. Por isso, esse tipo de contrato classifica-se doutrinariamente como um contrato aleatório, isto é, um negócio jurídico bilateral condicionado ao risco de ocorrência de um evento futuro e incerto (sinistro).

O risco de sinistro também justifica que o segurado pague uma remuneração ao segurador. A essa remuneração dá-se o nome de “prêmio”. Portanto, prêmio é a contraprestação que o segurado paga pela garantia do seu interesse legítimo, que pode envolver pessoa ou coisa, diante de riscos predeterminados, como está a denotar o art. 757 do CC:   

Art. 757. Pelo contrato de seguro, o segurador se obriga, mediante o pagamento do prêmio, a garantir interesse legítimo do segurado, relativo a pessoa ou a coisa, contra riscos predeterminados.

Parágrafo único. Somente pode ser parte, no contrato de seguro, como segurador, entidade para tal fim legalmente autorizada.

O fator risco no contrato de seguro é tão importante que, no curso do século XX, desenvolveu-se até mesmo, dentro da ciência matemática, o campo da atuária, cujo objeto diz respeito aos cálculos matemáticos utilizados pelas companhias de seguros para determinar o preço das apólices a partir do estudo das probabilidades que conduzem a acidentes e sinistros. A lógica é: quanto maior a probabilidade, maior o risco; logo, maior será o valor cobrado a título de prêmio pelo segurador.   

Desse modo, verifica-se que o risco é elemento essencial do contrato de seguro, no que se constitui o seu fator aleatório determinante. Por isso mesmo é nulo o contrato para garantia de risco proveniente de ato doloso do segurado, do beneficiário, ou de representante de um ou de outro (CC, art. 762).

Caso essa álea (fator sorte) do risco venha a ser alterada propositalmente pelo segurado, então temos que a natureza do contrato de seguro se desnatura. O agravamento do risco pelo contratante de seguro viola a boa-fé – um dos deveres anexos ou acessórios de conduta em qualquer negócio jurídico -, a impedir que a relação contratual desenvolva-se de maneira proba, honesta, ética. Em decorrência disso, o art. 768 do CC sanciona o comportamento antiético do segurado com a perda do direito à garantia:

Art. 768. O segurado perderá o direito à garantia se agravar intencionalmente o risco objeto do contrato.

Como exemplo prático de hipótese na qual a parte contraente agrava intencionalmente o risco do objeto do contrato, temos a participação em “rachas” ou “pegas” nas ruas de cidades. Com efeito, o segurado que participa com seu veículo, ou deixa alguém participar, de disputa automobilística não autorizada está efetivamente a incrementar a álea de ocorrência do sinistro. Com tal atitude, o segurado está a criar intencionalmente um risco não contratado, porquanto não se cogita que alguém possa contratar seguro de carro com o objetivo de protegê-lo de acidentes em competições automobilísticas ilegais nas vias urbanas.

Assim, podemos concluir que o segurado que de qualquer modo se envolve em “rachas” ou “pegas” está a criar um risco não previsto no pacto securitário. Logo, ao agir de má-fé, configura-se manifesto abuso de direito, a afastar o segurado dos limites estabelecidos para o exercício da garantia contratual.
 
Violando as cláusulas do contrato de seguro, o segurado fica desapercebido da garantia do seu interesse, que já não é mais legítimo, contra os riscos que criou com sua conduta imprudente e temerária de participação em "rachas" e "pegas". Consequentemente, perde o seu direito à garantia da proteção contratual e fica sem indenização securitária, a assumir sozinho o risco na virtual ocorrência de sinistro.

Precedente recomendado no STJ: REsp 1.368.766/RS     

terça-feira, 15 de março de 2016

RT COMENTA - DIREITO DO TRABALHO: Lei 13.189/15 (Lei do Programa de Proteção do Emprego - PPE)



Caro leitor, no campo do Direito do Trabalho, é recente a edição da Lei 13.189, de 19 de novembro de 2015. Esse diploma instituiu o “Programa de Proteção ao Emprego – PPE”, que visa, como demonstrarei a seguir, a preservar postos de trabalho em tempos de manifesta crise econômica.

Assim, no propósito de facilitar os estudos de Direito do Trabalho dos leitores do blogue do GERT, preparei uma revisão sobre os principais aspectos desse novel diploma relacionado à seara iuslaboral.


► Em que consiste o PPE?

O PPE consiste em ação para auxiliar os trabalhadores na preservação do emprego. Esse programa vai ao encontro do Programa do Seguro-Desemprego, estabelecido na Lei 7.998/90.

Aqui vale recordar que o Programa do Seguro-Desemprego tem dupla finalidade:

1)      prover assistência financeira temporária ao trabalhador desempregado em virtude de dispensa sem justa causa, inclusive a indireta, e ao trabalhador comprovadamente resgatado de regime de trabalho forçado ou da condição análoga à de escravo; 

2)      auxiliar os trabalhadores na busca ou preservação do emprego, promovendo, para tanto, ações integradas de orientação, recolocação e qualificação profissional. 

No caso da Lei 13.189/15, o legislador criou um programa que é corolário da segunda finalidade do PSD.

Portanto, se cair na prova qual a relação entre PSD e PPE, a resposta é que ambos têm por finalidade auxiliar os trabalhadores na preservação do emprego.


► Quais os objetivos do Programa de Proteção ao Emprego – PPE?

O Programa de Proteção ao Emprego – PPE tem cinco objetivos:

1)      possibilitar a preservação dos empregos em momentos de retração da atividade econômica; 

2)      favorecer a recuperação econômico - financeira das empresas; 

3)      sustentar a demanda agregada durante momentos de adversidade, para facilitar a recuperação da economia; 

4)      estimular a produtividade do trabalho por meio do aumento da duração do vínculo empregatício; e 

5)      fomentar a negociação coletiva e aperfeiçoar as relações de emprego. 


Quem pode aderir ao PPE?

Podem aderir ao PPE as empresas de todos os setores em situação de dificuldade econômico-financeira que celebrarem acordo coletivo de trabalho específico de redução de jornada e de salário. 

A prioridade legal de adesão para a empresa que demonstre observar a cota de pessoas com deficiência no seu rol de empregados.


► Até quando a empresa pode aderir ao PPE?

A adesão ao PPE pode ser feita até 31 de dezembro de 2016, sendo que o prazo máximo de permanência no programa é de vinte e quatro meses, respeitada a data de extinção do programa. 

► Quais os requisitos legais para que uma empresa possa aderir ao PPE?

Ato do Poder Executivo irá estabelecer as condições de adesão. Porém, a lei fixa de imediato, no seu art. 3º, seis requisitos mínimos para a adesão da empresa ao programa. Ei-los:

1)      celebrar e apresentar acordo coletivo de trabalho específico;

2)      apresentar solicitação de adesão ao PPE ao órgão definido pelo Poder Executivo; 

3)      apresentar a relação dos empregados abrangidos, especificando o salário individual; 

4)      ter registro no Cadastro Nacional da Pessoa Jurídica - CNPJ há, no mínimo, dois anos;

5)      comprovar a regularidade fiscal, previdenciária e relativa ao Fundo de Garantia do Tempo de Serviço – FGTS durante todo o tempo de adesão ao PPE, sob pena de desligamento; e 

6)      comprovar a situação de dificuldade econômico-financeira, fundamentada no Indicador Líquido de Empregos - ILE, considerando-se nesta situação a empresa cujo ILE for igual ou inferior a 1% (um por cento), apurado com base nas informações disponíveis no Cadastro Geral de Empregados e Desempregados - CAGED, sendo que o ILE consiste no percentual representado pela diferença entre admissões e demissões acumulada nos doze meses anteriores ao da solicitação de adesão ao PPE dividida pelo número de empregados no mês anterior ao início desse período. 

► Com a adesão da empresa ao PPE, o que pode vir a ser previsto no acordo coletivo de trabalho?

Segundo o art. 5º da Lei do PPE, o acordo coletivo de trabalho específico para adesão ao PPE, celebrado entre a empresa e o sindicato de trabalhadores representativo da categoria da atividade econômica preponderante da empresa, pode negociar os direitos à jornada e salário na forma seguinte:

1)      redução de jornada em até 30% (trinta por cento);

2)      redução de salário em até 30% (trinta por cento).  

Porém, essa redução fica condicionada à celebração de acordo coletivo de trabalho específico com o sindicato de trabalhadores representativo da categoria, observado o disposto no art. 511 da CLT.

Além disso, o valor do salário pago pelo empregador, após essa redução, não pode ser inferior ao valor do salário mínimo (art. 4º, § 2º). 

 
► Qual o procedimento para a aprovação do acordo coletivo de trabalho?

O acordo deve ser aprovado em assembleia dos trabalhadores abrangidos pelo programa.


Qual o conteúdo mínimo do acordo coletivo de trabalho?

O acordo coletivo de trabalho, celebrado especificamente para adesão ao PPE, deve dispor sobre:

1)      número total de empregados abrangidos pela redução e sua identificação; 

2)      estabelecimentos ou setores específicos da empresa abrangidos;  

3)      percentual de redução da jornada e redução proporcional ou menor do salário; 

4)      período pretendido de adesão ao PPE e de redução temporária da jornada de trabalho, que deve ter duração de até seis meses, podendo ser prorrogado por períodos de seis meses, desde que o período total não ultrapasse vinte e quatro meses; 

5)      período de garantia no emprego, que deve ser equivalente, no mínimo, ao período de redução de jornada acrescido de um terço; 

6)      constituição de comissão paritária, composta por representantes do empregador e dos empregados abrangidos pelo PPE, para acompanhar e fiscalizar o cumprimento do acordo e do programa, exceto nas microempresas e empresas de pequeno porte. 

► O acordo coletivo pode dispor ainda sobre outros direitos dos trabalhadores?

Não. Como se cuida de um contrato celebrado especificamente para fins de adesão ao PPE, ele não pode dispor acerca de outras condições de trabalho.

 
► É possível celebrar um acordo coletivo múltiplo?

Sim. Quando se tratar de um grupo de microempresas e empresas de pequeno porte, do mesmo setor econômico, a lei faculta a possibilidade de celebração de acordo coletivo múltiplo de trabalho com o sindicato de trabalhadores representativo da categoria da atividade econômica preponderante. 

Contudo, nessa hipótese, cada microempresa ou empresa de pequeno porte deverá demonstrar individualmente o cumprimento dos requisitos exigidos para adesão ao PPE. 


► Na hipótese de uma empresa aderir ao PPE, com a conseguinte redução salarial, seus empregados têm direito à compensação?

Sim. Nos termos do art. 4º, os empregados de empresas que aderirem ao PPE e que tiverem seu salário reduzido fazem jus a uma compensação pecuniária equivalente a 50% (cinquenta por cento) do valor da redução salarial e limitada a 65% (sessenta e cinco por cento) do valor máximo da parcela do seguro-desemprego, enquanto perdurar o período de redução temporária da jornada de trabalho. 


► Quem custeará essa compensação?

O custeio será feito pelo Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT) na forma de ato regulamentar a ser expedido pelo Poder Executivo.


► A compensação pecuniária gera efeitos previdenciários?

Sim. A compensação pecuniária integra as parcelas remuneratórias para efeito de contribuição a cargo da empresa destinada à Seguridade Social, na forma do disposto no inc. I do art. 22, e também integram o salário-de-contribuição, na forma do § 8º do art. 28, ambos os dispositivos previstos na Lei 8.212/91 (LCPS). 


► A compensação pecuniária entra no cálculo do FGTS?

Sim. Nos termos do art. 15 da Lei 8.036/90 (LFGTS), a empresa fica obrigada a depositar, até o dia 7 (sete) de cada mês, em conta bancária vinculada, a importância correspondente a 8 (oito) por cento da remuneração paga ou devida, no mês anterior, a cada trabalhador sobre o valor da compensação pecuniária a ser paga no âmbito do Programa de Proteção ao Emprego – PPE. 


► A adesão ao PPE implica algum tipo de restrição à empresa?

Sim. A empresa que aderir ao PPE fica proibida de praticar três ações:

1)      dispensar arbitrariamente ou sem justa causa os empregados que tiverem sua jornada de trabalho temporariamente reduzida enquanto vigorar a adesão ao PPE e, após o seu término, durante o prazo equivalente a um terço do período de adesão; 

2)      contratar empregado para executar, total ou parcialmente, as mesmas atividades exercidas por empregado abrangido pelo programa, exceto nas hipóteses de:  

a)      reposição;

b)      aproveitamento de concluinte de curso de aprendizagem na empresa, nos termos do art. 429 da CLT.

Mas é importante frisar que, caso o empregado venha a ser contratado para reposição ou aproveitamento de concluinte de curso de aprendizagem na empresa, ele deverá necessariamente ser abrangido pelo acordo coletivo de trabalho específico, que subsidiou a adesão da empresa ao PPE.

3)      Exigir horas extraordinárias dos empregados abrangidos pelo programa durante todo o período de adesão (art. 6º, § 2º).


► Caso uma empresa deseje desligar-se do PPE, qual o procedimento adotado? Esse desligamento poderá ser feito a qualquer tempo?

A empresa pode denunciar o PPE a qualquer momento desde que:

1)      comunique o ato ao sindicato que celebrou o acordo coletivo de trabalho específico,

2)      comunique o ato aos seus trabalhadores; e

3)      comunique o ato ao Poder Executivo.

Nas três hipóteses, o ato de comunicação da denúncia do PPE pela empresa deverá demonstrar as razões e a superação da situação de dificuldade econômico-financeira (art. 7º).

Além disso, essa denúncia não é considerada descumprimento dos termos do acordo coletivo de trabalho específico (art. 8º, § 2º). 


► Na hipótese de denúncia do PPE pela empresa, as restrições anteriormente aplicadas suspender-se-ão imediatamente?

Não. A lei estabelece para a empresa denunciante algumas condições que se aplicarão mesmo após o seu desligamento do PPE. Ei-las:

1)      Somente após o prazo de trinta dias, pode a empresa exigir o cumprimento da jornada integral de trabalho;

2)      Deve ser mantida a garantia de emprego, nos termos da adesão original ao PPE e seus acréscimos;

3)      Somente após seis meses da denúncia, pode a empresa aderir novamente ao PPE, caso demonstre que enfrenta nova situação de dificuldade econômico-financeira. 


É possível proceder à exclusão de uma empresa do PPE? Em que condições?

A exclusão de uma empresa do PPE é possível quando se verificar que;

1)      A empresa descumpriu os termos do acordo coletivo de trabalho específico relativo à redução temporária da jornada de trabalho ou qualquer outro dispositivo desta Lei ou de sua regulamentação;  

2)       cometeu fraude no âmbito do PPE; ou 

3)      foi condenada por decisão judicial transitada em julgado ou autuada administrativamente após decisão final no processo administrativo por prática de trabalho análogo ao de escravo, trabalho infantil ou degradante. 

Realizado o procedimento de exclusão, a empresa excluída fica também impedida de aderir ao PPE novamente (art. 8º caput).


► Quais as consequências para a empresa que for excluída do programa por motivo de descumprimento do ACTE ou das normas relativas ao PPE?

A empresa que descumprir o acordo coletivo ou as normas relativas ao PPE fica obrigada:

1)      a restituir ao FAT os recursos recebidos, devidamente corrigidos, e

2)      a pagar multa administrativa correspondente a 100% (cem por cento) desse valor, calculada em dobro no caso de fraude, a ser aplicada conforme o art. 626 e ss. da CLT, que dispõe sobre o processo das multas administrativas.  

O valor arrecadado com o pagamento da multa administrativa será revertido ao FAT (art. 8º, § 1º).


► A quem se aplica a Lei 13.189/15?

A Lei do PPE aplica-se tão somente às solicitações de adesão ou de prorrogação em tramitação na data de sua publicação ou protocoladas a partir dessa data.

No caso de adesões ao PPE já aprovadas, estas permanecem regidas pela MP 680/15.


► É possível uma empresa, cujo PPE já tenha sido aprovado, reivindicar adaptação aos termos da Lei 13.189/15?

Sim, fica facultado às empresas a prorrogação dos prazos e a adoção das demais condições previstas na Lei 13.189/15, contanto que o faça mediante aditivo ao acordo coletivo de trabalho específico. 


► O PPE instituído pela Lei 13.189/15 é permanente?

Não. O PPE extingue-se em 31 de dezembro de 2017.