sábado, 28 de abril de 2012

RESUMO RT - CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE - Parte III: Teoria da Inconstitucionalidade


Recapitulação

Na segunda parte deste resumo, o leitor pôde acompanhar o tema relativo aos precedentes históricos do controle de constitucionalidade. Foi abordado com pormenores, assim, o lead case mais importante para a construção doutrinária da técnica do controle de constitucionalidade: o caso Marbury v. Madson (1803), julgado pela Suprema Corte dos Estados Unidos da América. Foi nesse precedente que o juiz John Marshall, em seu voto condutor, deu origem à técnica de fiscalização da constitucionalidade dos atos normativos, tal como se encontra estruturada na concepção do constitucionalismo moderno: se a Constituição é a lex suprema, eventual ato infraconstitucional que venha a desrespeitar suas normas deve ser invalidado. A Constituição, desse modo, é parâmetro do controle, enquanto os demais atos normativos podem constituir objeto desse controle. A Constituição é que deve prevalecer, competindo ao Poder Judiciário (e não ao Poder Legislativo ou Executivo) o papel de intérprete definitivo do texto constitucional. A Corte Suprema estadunidense inaugurou, assim, o judicial review na história do Direito Constitucional.     
Na terceira parte do resumo de controle de constitucionalidade, tratarei da(s) teoria(s) que circundam o fenômeno da inconstitucionalidade das leis e atos normativos. E, não obstante este seja um resumo destinado aos concursos públicos, se preciso for, não me furtarei a aprofundamentos, até porque as questões fáceis de controle de constitucionalidade estão a cada dia menos usuais nos certames.

Vamos começar, pois.

A teoria da inconstitucionalidade como apanágio do princípio da supremacia da Constituição.

Já anotei na primeira parte deste resumo que o princípio da supremacia da Constituição ocupa lugar de destaque no constitucionalismo moderno. Por esse princípio, o texto constitucional funciona como a "lei das leis", isto é, a lei suprema, a lei superior. Como norma principal do sistema jurídico, há de atribuir-se-lhe a característica de ser o núcleo derredor do qual todas as demais normas hão de circular. Consequentemente, a força normativa da Constituição implica o reconhecimento de que as normas constitucionais irradiam seus efeitos sobre todos - das pessoas físicas às jurídicas, das pessoas públicas às privadas. Todo aquele que se insere nesse sistema, submete-se à primazia do texto constitucional na regência primaz dos bens da vida.

Mas é preciso aclarar ao leitor que, não obstante o que se afirma acima, nem toda conduta infringente dos preceitos da Constituição há de considerada "inconstitucional". Do ponto de vista técnico, não se considera "inconstitucional" senão as condutas violadoras da Constituição que tenham sido levadas a cabo por órgãos públicos integrantes da estrutura estatal. Ou seja, a teoria da inconstitucionalidade não foi criada para sancionar atos privados, mas sim atos eminentemente públicos. Daí ser possível corrigir atecnia frequente, que consiste em cominar de "inconstitucional" todo e qualquer ato que infrinja os valores prescritos na lei superior. Pode-se até fazê-lo, mas desde que num sentido filosófico, ideal, de julgamento axiológico. Tecnicamente, contudo, as condutas de particulares que violem norma consitucional não são objeto de ataque pela via da jurisdição constitucional afetada ao exercício do controle de constitucionalidade. Em tais casos, outros são os mecanismos sancionadores das condutas privadas "inconstitucionais" (a mera alegação de que atos de particulares que vulneram lei infraconstitucional não invalidada à luz da Constituição já permite o controle desses atos, por exemplo). 

Com isso, o leitor fica sabendo que nem toda conduta contrária à Constituição é - tecnicamente - inconstitucional. A desconformidade das ações praticadas nas relações entre particulares durante a vida cotidiana, ou mesmo por particular em relação jurídico-pública, não aciona o controle de constitucionalidade como mecanismo sancionador. Este último regime de sanção (controle de constitucionalidade) existe especificamente para a fiscalização da validade das leis e demais atos normativos do Poder Público.


A teoria da escada ponteana aplicada ao controle de constitucionalidade e seus reflexos nos planos de existência, validade e eficácia da norma inconstitucional.

No plano da chamada Teoria Geral do Direito Civil, há tópico que comporta o estudo dos elementos do negócio jurídico (os essenciais, os naturais, os acidentais). Nessa seara, ganha destaque a teorização desenvolvida pelo jurista Pontes de Miranda (1892-1979), segundo a qual o negócio jurídico apresenta três planos distintos, a saber: plano da existência, plano da validade e plano da eficácia. Os civlistas costumam chamar essa teoria de "escada ponteana", pois um plano pressuporia logicamente o outro em ordem de verificação pelo intérprete: primeiro o plano da existência, depois o da validade e, por último, o da eficácia.

No plano do Direito Constitucional, essa teoria é apropriada para fins de analisar os atos jurídicos categorizados sob a forma de normas jurídicas - atos normativos que decorrem do atuação de órgãos constitucionais que têm a incumbência sistêmica de elaborá-los, para criar ou modificar situações da vida, em regra, com caráter geral e abstrato. Sendo assim, parece fácil entender que as normas jurídicas permitem sejam analisadas à luz da escada ponteana nos seus planos de existência, validade e eficácia.

Fixadas essas premissas teóricas, o leitor deve observar que, em se tratando de teoria da inconstitucionalidade, a análise dos atos normativos na sua dimensão tridimensional tem importância ímpar. Isso porque à Constituição compete estabelecer o modus operandi de produção normativa. Dessa maneira, a criação de leis, bem assim os demais atos normativos, tem na Consitutição um ponto de partida (no processo legislativo) e um ponto de chegada (no conteúdo dos valores assimiláveis pelo múnus legiferante). Nesse contexto, lei ou ato normativo que venha a desrespeitar o texto constitucional merece ser fiscalizado - e a via da fiscalização é justamente o controle de constiucionalidade. É quando o ato normativo atacado pode ser invalidado pela jurisdição constitucional, gerando efeitos na ordem jurídica a que pertence. Saber que efeitos o ato reputado inconstitucional produz, portanto, é o cerne da teoria da inconstitucionalidade. E a delimitação desses efeitos só pode ser coerentemente apreendida se se assumir como premissa teórica de análise a escada ponteana.

Guiado por esse pensamento, permita-me o leitor pontuar alguns aspectos básicos dos planos de existência, validade e eficácia dos atos jurídicos:

a) plano de existência: o intérprete, quando se propõe a debater esse plano, deve ter em mente que a "existência", por força de lógica, só pode ser corretamente apreendida quando em oposição à "inexistência". Trata-se de raciocínio que visa a aclarar que nem todos os fatos da vida interessam ao direito, mas apenas aqueles que foram juridicizados.

A juridicização, portanto, consiste precisamente no fenômeno mediante o qual um fato da vida é transposto para o mundo jurídico. Esse processo de transposição inicia-se quando a lei estabelece determinados elementos em sua hipótese de incidência, de tal modo que o fato da vida que venha a preenchê-los, no caso concreto, faz jus à "colorização" jurídica. Em conclusão: a existência do fato para o direito ocorre quando sua manifestação fenomênica comporta os elementos constitutivos da hipótese de incidência prevista na lei, os quais atraem o comando legal, funcionando como causa eficiente de sua juridicização. Ato que atrai e sofre a incidência do comando legal, desse modo, é o ato que "existe" juridicamente (é ato jurídico, portanto).

Dentre os elementos constitutivos da hipótese de incidência, é possível identificar elementos comuns (agente, objeto e forma) e específicos a determinada categoria de atos. Mas, independentemente da classificação que se faça em doutrina, o importante é compreender que, na ausência dos elementos constitutivos, o ato não fará incidir sobre si a regra legal. Ou seja, será ato que não adentrará o mundo jurídico, não será juridicizado. Logo, será considerado ato inexistente, o que não significa dizer que não merecerá a atenção do direito, o qual, muita vez, voltar-se-á contra ele, a fim de expurgá-lo e disciplinar suas consequências.

b) plano de validade: o intérprete, neste plano, depara-se com o problema que consiste em saber se o ato existente é também válido. Para isso, além dos elementos constitutivos que autorizaram a incidência da norma que o juridicizou e colocou no mundo do direito (primeiro degrau de análise na escada), esse ato deve observar alguns requisitos previstos em lei (segundo degrau de análise). Tais requisitos importam a qualificação desse ato que existe, dando-lhe uma dimensão de conformidade, de perfeição jurídica, à luz da norma legal. Mutatis mutandis, é como se a lei adjetivasse o substantivo, sendo o adjetivo sua dimensão de validade. Com isso, é fácil concluir que só os elementos constitutivos (agente, objeto, forma) não bastam para a perfectibilização do ato; deve ele também apresentar elementos qualificativos, atributos sem os quais o ato existe, porém é inválido (por exemplo, agente competente, objeto lícito e possível, forma prescrita em lei).

Embora inválidos, os atos jurídicos não deixam de importar ao ordenamento, o qual deles se ocupa para disciplinar em duas frentes: de um lado, na definição da sanção - que pode ser de nulidade ou anulabilidade conforme a gravidade do ato; de outro, no disciplinamento dos efeitos decorrentes do preceito sancionador que comina a invalidade.

Especificamente no caso do Direito Constitucional, ter-se-á por inválida lei contrária à Constituição. Observa o leitor que não se cuida de ato inexistente, o que se daria, exemplificativamente, no caso de lei editada por órgão não parlamentar, sem autorização constitucional para legislar (é pressuposto sine qua non da existência de uma lei que ela tenha sido editada por órgão parlamentar, isto é, o agente constitucionalmente autorizado a manifestar a vontade de criar ou modificar a disciplina da vida social em caráter geral e abstrato). O exemplo a que me refiro é de ato inválido.

Assim, eventual norma constitucional contrária à Constituição, seja por vício de índole formal ou material, mas que tenha ingressado no ordenamento jurídico, não é ato inexistente; pelo contrário, esse ato existiu, tanto é que ingressou no ordenamento e pode até mesmo ter produzido efeitos. A norma constitucional que ingressa no ordenamento jurídico com conteúdo contrário ao texto da Constituição é norma inconstitucional (norma que viola preceitos da lei superior, da lei suprema), o que significa dizer, por outras palavras, que norma inconstitucional é norma inválida (ela é sancionada no segundo degrau da escada).

c) plano da eficácia: é o plano por meio do qual o intérprete avalia se o ato está apto a produzir efeitos. Eficácia de um ato nada mais é que sua capacidade de gerar os efeitos que lhe são próprios. Ato eficaz é ato exigível, executável, exequível, aplicável, em suma, é ato que atinge a finalidade para a qual foi criado.

Em se tratando da teoria da inconstitucionalidade, é preciso avaliar a eficácia de um ato jurídico em específico. Trata-se da eficácia das normas jurídicas. Nesses casos, por eficácia normativa, devemos compreender a capacidade que tem a norma de regular as situações da vida para a disciplina das quais foi criada. Destarte, sendo norma inconstitucional norma inválida, como vimos acima, há de se perquirir as consequências da sua invalidação no plano eficacial. E as consequências são claras: norma inválida à luz da Constituição não deve ser aplicada. A invalidade, por conseguinte, é vício que, uma vez reconhecido, projeta-se para a dimensão eficacial, retirando da norma sua capacidade de gerar os efeitos que lhe foram atribuídos para a regência da vida social.

Aqui cabe considerar um detalhe a ser explorado melhor futuramente: o controle possui diversas classificações. Uma delas dá-se quanto à finalidade da fiscalização da constitucionalidade. Nesse prisma, e de maneira breve, pode-se dividi-la em controle concreto (a verificação da compatibilidade entre o objeto e o parâmetro constitucional é feita incidenter tantum para o deslinde de questão de fato que motivou a demanda, de modo que seus efeitos serão apenas inter partes) ou controle abstrato (a verificação da compatibilidade entre o objeto e o parâmetro constitucional é feita principaliter tantum no processo, pois o objeto litigioso é a própria discussão acerca da constitucionalidade do ato normativo, de maneira que a decisão proferida em tal via será imunizada pela coisa julgada material, atribuindo-se-lhe efeitos erga omnes). Pois bem. Nesse contexto, vale lembrar ao leitor que o reconhcimento da ineficácia do ato inválido (inconstitucional) importará efeitos distintos, de acordo com uma ou outra das finalidades do controle. No caso de controle concreto, em que a discussão de constitucionalidade do ato normativo é meramente incidental, a ineficácia dar-se-á apenas entre as partes do litígio. Já no caso do controle abstrato, que é aquele que deflagra a fiscalização em tese da norma, como objeto principal da demanda, a ineficácia (incapacidade de o ato produzir efeitos) irradiará suas consequências para todos os jurisdicionados.

Mas é preciso alertar o leitor para um problema de ordem da filosofia do direito. Cuida-se de saber se a norma inconstitucional, uma vez reconhecida sua invalidade e, conseguintemente, cassada sua eficácia, deixa de fazer parte do ordenamento jurídico. Esse é um ponto interessante do controle que muitas vezes é tratado de maneira equivocada por distintos doutrinadores. Quero dizer o seguinte: norma declarada inválida (incontitucional) não desaparece do ordenamento jurídico! Ela continua a pertencer a ele, pois somente outra norma poderá retirar-lhe a existência - ou seja, o instituto que implica o desfazimento de norma jurídica é a revogação. O que a declaração de inconstitucionalidade faz não é subtrair a norma jurídica do ordenamento, como boa parte dos estudiosos supõe. A jurisdição constitucional, atuando em sede de controle, julga inválida norma para efeito de subtrair sua dimensão de eficácia (ela não pode regular a vida, não pode ser aplicada). Com isso, é evidente que a norma inconstitucional torna-se aquilo que comumente se chama de "letra morta", que nada mais é do que a norma ineficaz - inidônea a reger a vida societal, porquanto incapaz de produzir os efeitos para os quais foi concebida. Mas essa sua ineficácia não importa automaticamente a retirada de sua vigência (validade técnico-formal, existência no mundo jurídico). Só a revogação cassa a vigência (existência de uma norma, empurrando-a para fora do primeiro degrau da escada). Só a revogação retira o preceito invalidado do ordenamento que compunha ante a manifestação de vontade do órgão que originalmente a formulou (regra geral o Parlamento). Prova disso é que a revogação de uma lei produz, em regra, efeitos ex nunc (prospectivos, para o futuro, pois até então a lei existia, ainda que reconhecidamente inválida), ao passo que a declaração de inconstitucionalidade de uma norma, levada a efeito pelo Poder Judiciário, opera efeitos retroativos (ex tunc).

Teorias sobre a natureza do ato inconstitucional

Avançando com o resumo, chegamos ao ponto de estudo das teorias que cercam a declaração de invalidade de uma norma. Um ato normativo impugnado, quando cotejado com o parâmetro que lhe serve de referência, pode ser invalidado pelo controle de constitucionalidade. Disso derivam consequências jurídicas. Mas quais? É o que devemos compreender.

Sobre as consequências da invalidação de ato contrário à Constituição, existem duas teorias principais: a primeira (teoria da nulidade), nascida na tradição do pensamento federalista dos Estados Unidos, entende que norma inconstitucional é norma nula de pleno de direito; a segunda (teoria da anulabilidade), por sua vez, defendida por Hans Kelsen, sustenta que norma inconstitucional é norma meramente anulável.

Em se tratando de leis inconstitucionais, a teoria da nulidade da norma prevaleceu na maioria dos países que adotaram o controle jurisdicional de constitucionalidade, incluindo o Brasil. Segundo essa teoria, ato normativo que viola a Constituição deve ser considerado nulo de pleno direito. Se o texto constitucional é o texto supremo (princípio da supremacia da Constituição), admitir que norma infraconstitucional inválida pudesse regular as situações para as quais foi criada, produzindo efeitos regulares e válidos, significaria permitir que um ato inferior se sobrepusesse ao superior, negando vigência ao texto consttucional. Em suma: o princípio da supremacia da Constituição seria sacrificado. Em razão disso, a fim de salvaguardar o princípio ameaçado, deve ser considerada nula a norma inconstitucional, reconhecendo-se que ato inválido à luz da Constituição não produz efeitos e tampouco pode ser convalidado.

Ora, como o ato é impugnado desde o reconhecimento de um vício de origem (afronta à Constituição) que o comina de nulo, a decisão que reconhece a inconstitucionalidade, segundo a teoria da nulidade da lei inconstitucional, é uma decisão declaratória, na medida em que apenas reconhece situação preexistente. Disso decorre que os efeitos da decisão serão retroativos (ex tunc), pois ato inválido não pode produzir efeitos, sob pena de negar vigência ao texto da Constituição. Assim, a lei inconstitucional, desde sua entrada no ordenamento, deve ser considerada sem efeitos válidos, impondo-se o desfazimento das relações jurídicas que se formaram derredor do ato nulificado (retorno ao status quo ante). É algo substanciamente diferente do que propunha a iusfilosofia kelseniana com sua teoria da anulabilidade da norma inconstitucional, para a qual o ato que violasse a Constituição seria meramente anulável, ou seja, ele produziria efeitos válidos até que fosse reconhecido o vício que o inquinava por um tribunal constitucional (controle concentrado). Sendo assim, para a teoria da anulabilidade, a decisão que afirmasse a invalidade do ato normativo seria uma decisão constitutiva negativa - isto é, uma decisão que desconstitui, que desfaz os efeitos do ato, reconhecendo situação não preexistente até o pronunciamento da corte constitucional. Nesse sentido, por se tratar de decisão desconstitutiva, o juízo de inconstitucionalidade que retirasse norma do mundo jurídico produziria efeitos tão somente prospectivos, para o futuro (ex nunc), não retroagindo ao momento da edição da lei inválida. Contudo, o leitor deve ficar atento: mesmo na teoria da anulabilidade, se o tribunal constitucional acolher a tese da constitucionalidade da norma guerreada, estar-se-á diante de decisão declaratória, pois milita em favor dos atos legislativos a presunção de validade (seria como se o tribunal apenas tivesse reforçado em acordão a validez do ato presumida ab initio).    


Temperamentos à teoria da nulidade da norma inconstitucional no controle de constitucionalidade brasileiro

Neste momento, cumpre advertir o leitor quanto ao seguinte detalhe: o Brasil adota a teoria estadunidense da nulidade da norma inconstitucional - mormente difundida ante a acolhida que recebeu no voto lapidar do juiz John Marshall no caso Marbury v. Madson (ver parte II deste resumo). É o que prevalece na jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, incorporando, desse modo, tradição de longa data no consitucionalismo pátrio (o jurista Ruy Barbosa, p. ex., já ao tempo da República Velha, defendia-a). Sucede que a decisão declaratória de nulidade da norma inconstitucional gera problemas de ordem prática. Sim, pois casos há em que o ato normativo invalidado, durante o período de sua vigência, regulou situações jurídicas que se tornaram irreversíveis, impedindo, portanto, o retorno ao status quo ante, tal como preconiza essa teorização.

Diante desse impasse, a teoria da nulidade do ato inconstitucional viu-se forçada a promover atenuações à premissa de que "lei violadora da Constituição não produz efeitos válidos". Com isso, passou-se a reconhecer no Brasil temperamentos a essa doutrina, o que foi legalmente reforçado pela Lei 9.868/99 (Lei das ADIs), diploma em que há previsão da chamada modulação temporal dos efeitos da declaração de inconstitucionalidade, minorando os efeitos retroativos rígidos da pronúncia de nulidade. Também no plano jurisprudencial, o STF tem abraçado a ideia de que a pronúncia de nulidade com efeitos ex tunc não pode ignorar a realidade fática que se consolidou ao tempo em que vigente o ato atacado e nulificado pela jurisdição constitucional em sede de controle. Nesses casos, há que se prestigiar valores outros, tais como a boa-fé e a segurança jurídica, de igual estatutura na escala valorativa da Constituição.

Um bom exemplo prático desse tirocínio que vem atenuando o caráter retroativo do pronunciamento de nulidade da norma inconstitucional dá-se em relação à coisa julgada inconstitucional. Nesse contexto, a doutrina defende que eventual declaração de inconstitucionalidade de ato normativo não tem o condão de prejudicar a coisa julgada, cuja proteção mereceu o qualificativo de direito fundamental em expressa determinação do povo constituinte (art. 5º, XXXVI). Em tais hipóteses, a eficácia erga omnes do pronunciamento de nulidade em sede de controle não desconstitui a decisão judicial que se apropriou em seus fundamentos de lei declarada posteriormente inconstitucional. O máximo que se pode admitir é o uso de ação rescisória no prazo que lhe é cabível de acordo com as leis de processo. Todavia, findo o prazo decadencial da rescisória, afigurar-se-á impossível alterar a decisão trânsita em julgado.

Ainda nesse contexto dos temperamentos à teoria da nulidade do ato inconstitucional, o STF admite o emprego das técnicas da interpretação conforme a Constituição (confere-se um sentido interpretativo à norma impugnada, reduzindo o âmbito de sua incidência ante o afastamento das interpretações discrepantes com aquele definida pelo tribunal) e a declaração de nulidade sem redução de texto (por meio dessa técnica, o tribunal reduz o âmbito de incidência da norma ao declarar inconstitucional determinada hipótese de aplicação do ato impugnado, mas não para sacrificar o texto normativo, que fica preservado em sua inteireza redacional). Porém, a Corte Suprema brasileira rejeita a tese da inconstitucionalidade superveniente, entendendo que os atos infraconstitucionais anteriores contrastantes com a Constituição vigente considerar-se-ão não recepcionados, havendo inclusive instrumento processual específico para atacá-los na condição de objeto do controle de constitucionalidade (ADPF, na experiência brasileira).

Mas, sem dúvida, a principal demonstração de temperamento à teoria da nulidade do ato inconstitucional no controle de constitucionalidade brasileiro dá-se por força do disposto no art. 27 da Lei 9.868/99. In verbis:     

Art. 27. Ao declarar a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo, e tendo em vista razão de segurança jurídica ou de excepcional interesse social, poderá o Supremo Tribunal Federal, por maioria de dois trços de seus membros, restringir os efeitos daquela declaração ou decidir que ela só tenha eficácia a partir de seu trânsito em julgado ou de outro momento que venha a ser fixado.

Esse dispositivo de lei há tempos era reclamado pela doutrina, que via na produção empedernida de efeitos ex tunc, oriunda da teoria da nulidade, consequências muita vez não queridas pela própria Constituição. A Lei das ADIs, desse modo, buscou definir os parâmetros de flexibilização do dogma da nulidade da lei inconstitucional, estabelecendo, por exemplo, quorum de dois terços para que o STF venha a ponderar interesses em disputa, valendo-se, para tanto, de decisão não retro-operante em sede de controle de constitucionalidade.



domingo, 15 de abril de 2012

DA INTERVENÇÃO FEDERAL ESPONTÂNEA NA HIPÓTESE DE DESEQUILÍBRIO FINANCEIRO DOS ESTADOS E DO DISTRITO FEDERAL: comentários ao art. 34, V, a, da CF/88 no contexto do Direito Financeiro

Introdução

          Em que pese a descentralização político-administrativa dos entes componentes do pacto federativo, a Constituição Federal de 1988 arrola hipóteses de admissibilidade excepcional da intervenção do ente central (União) nos demais entes federados (Estados-membros e Distrito Federal). Dentre essas hipóteses, encontramos a do inc. V, “a”, do art. 34, segundo a qual a União poderá intervir nos Estados ou no DF cuja Fazenda Pública suspender o pagamento da dívida fundada por mais de dois anos consecutivos, salvo motivo de força maior. A ratio desse mandamento interventivo excepcional é fazer frente à necessidade de reorganização das finanças do Estado-membro ou do DF, evitando colapso financeiro pelo endividamento fazendário exacerbado e calote generalizado da dívida pública.
          Mas essa específica autorização interventiva que a Constituição dá só se pode compreender nos marcos do Direito Financeiro, que é o subsistema jurídico que se ocupa da disciplina da atividade financeira estatal alicerçada em três grandes núcleos: orçamento (público), receita (pública) e despesa (pública). Friso o termo “público”, haja vista os conceitos da atividade financeira serem usuais também no campo do direito privado.
          É nesse prisma do Direito Financeiro que redigirei o presente artigo. Sua finalidade é esclarecer o significado jurídico do termo "dívida pública fundada", que o leitor encontra na Constituição de 1988 (art. 34, V, a). Ao final, tecerei breves considerações sobre o caráter "espontâneo" da medida interventiva na hipótese em comento, qual seja, intervenção federal para a defesa das finanças públicas.  
       
O conceito de dívida pública fundada/consolidada: análise do cipoal normativo do Direito Financeiro sobre a matéria.

          No plano doutrinal, a dívida pública pode ser classificada com fulcro em dois critérios: origem dos recursos e prazo de vencimento. Quanto ao primeiro critério, temos que a dívida pública pode ser interna (quando contraída dentro do país) ou externa (quando contraída no exterior). Quanto ao prazo de vencimento, a dívida pública pode ser flutuante (quando contraída por prazo não superior a doze meses) e fundada/consolidada (quando contraída por prazo superior a doze meses). Para fins de intervenção federal, interessa-me sobremodo esta última classificação (prazo de vencimento), que é a que se reporta ao texto constitucional do art. 34, V, a, da CF/88.
          No plano dogmático jurídico-legal do Direito Financeiro, a conceituação de dívida pública (“valores que o Estado está a dever a credores”) deve ser buscada nos diplomas de regência da matéria. Dela o legislador se ocupou em pelo menos duas leis: Lei 4.320/64 (Lei do Direito Financeiro - LDF) e Lei Complementar 101/00 (Lei de Responsabilidade Fiscal- LRF).
          Segundo a LDF, a dívida pública fundada deve constar na Mensagem de proposta orçamentária que o Poder Executivo encaminhará ao Poder Legislativo nos prazos estabelecidos na Constituição (art. 22, I), devendo ser ainda escriturada com individuação e especificações que permitam verificar, a qualquer momento, a posição dos empréstimos, bem como os respectivos serviços de amortização e juros (art. 98, § único) – norma relacionada à contabilidade da dívida pública. Mas que é essa dívida para a lei? A resposta está a contrario sensu no art. 92, que estipula as parcelas integrantes da dívida flutuante.


         Art. 92. A dívida flutuante compreende:
        I - os restos a pagar, excluídos os serviços da dívida;
        II - os serviços da dívida a pagar;
        III - os depósitos;
        IV - os débitos de tesouraria.
        Parágrafo único. O registro dos restos a pagar far-se-á por exercício e por credor distinguindo-se as despesas processadas das não processadas.

          Logo, tudo que não for parcela integrante da dívida flutuante considerar-se-á divida fundada ou consolidada.
          Mas um conceito mais didático se encontra no Decreto 93.872/86 (Decreto de unificação dos recursos de caixa do Tesouro Nacional), o qual preceitua no seu art. 115, §§ 1º e 2º:

Art . 115. A dívida pública abrange a dívida flutuante e a dívida fundada ou consolidada.
§ 1º A dívida flutuante compreende os compromissos exigíveis, cujo pagamento independe de autorização orçamentária, assim entendidos:
a) os restos a pagar, excluídos os serviços da dívida;
b) os serviços da dívida;
c) os depósitos, inclusive consignações em folha;
d) as operações de crédito por antecipação de receita;
e) o papel-moeda ou moeda fiduciária.
§ 2º A dívida fundada ou consolidada compreende os compromissos de exigibilidade superior a 12 (doze) meses contraídos mediante emissão de títulos ou celebração de contratos para atender a desequilíbrio orçamentário, ou a financiamento de obras e serviços públicos, e que dependam de autorização legislativa para amortização ou resgate.

A LRF, no seu art. 29, I, também trouxe conceituação do que se entende juridicamente por “dívida pública fundada” (expressão do texto constitucional) ou dívida pública consolidada (expressão preferida pelo legislador infraconstitucional). Vejamos:

Art. 29. Para os efeitos desta Lei Complementar, são adotadas as seguintes definições:
        I - dívida pública consolidada ou fundada: montante total, apurado sem duplicidade, das obrigações financeiras do ente da Federação, assumidas em virtude de leis, contratos, convênios ou tratados e da realização de operações de crédito, para amortização em prazo superior a doze meses; [...]

De tudo o que expus e colacionei, já me parece ser possível concluir com o leitor que, sempre que o texto constitucional referir-se à “dívida pública fundada”, estará a pressupor aqueles compromissos obrigacionais contraídos por prazo superior a doze meses, isto é, obrigações de médio e longo prazo. Em contrapartida, as obrigações de curto prazo enquadrar-se-iam no conceito de dívida pública flutuante.  
Ocorre que a própria LRF cuidou de excepcionar esse conceito, ampliando-o em duas hipóteses: uma específica para a União e outra aplicável a todos os entes federados. Assim é que a dívida relativa à emissão de títulos de responsabilidade do Banco Central do Brasil (dívida pública mobiliária) será incluída na dívida consolidada da União (art. 23, § 2º). Da mesma forma, as operações de crédito cujas receitas tenham constado do orçamento, mesmo não tendo prazo inferior a doze meses, também hão de integrar a dívida pública consolidada de todos os entes da Federação. É com base nesta última hipótese que se admitie em doutrina o reconhecimento de uma nova espécie de classificação da dívida pública: a consolidada de curto prazo.
Mas o legislador foi além e ampliou ainda mais o conceito de dívida consolidada ao determinar que “Os precatórios judiciais não pagos durante a execução do orçamento em que houverem sido incluídos integram a dívida consolidada, para fins de aplicação dos limites.” (LRF, art. 30, § 7º). Este último preceito da LC 101/00 deve, todavia, ser lido com cuidado: a intenção que cerca o artigo é permitir a inclusão, nos cálculos dos limites do endividamento público, dos precatórios judiciais inadimplidos pela Fazenda Pública. Isso ocorre porque a dívida pública deve submeter-se a limites. Não fosse assim e o Estado tornar-se-ia facilmente insolvente, haja vista o mau vezo dos administradores quanto à contratação de empréstimos para obras públicas “suntuosas” – o mais das vezes inúteis para grande parte da população. Esses limites do endividamento público serão fixados pelo Senado Federal mediante proposta do Presidente da República (CF, art. 52, VI). Serão ainda limites “globais”, isto é, limites gerais, aplicáveis ao montante da dívida pública consolidada da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios (LRF, art. 30, I, c/c art. 52, VI, da CF/88).
Tais limites globais foram previstos pelo Senado Federal na Resolução (com efeitos externos) nº 40 de 2001 – posteriormente alterada pela Resolução nº 5 de 2002. Mas referida resolução não apenas estipulou os limites do endividamento público, como também trouxe o conceito de “dívida pública consolidada”. Trata-se de conceito deveras útil o da resolução senatorial, porquanto reúna, em texto consolidado, todas as observações que fiz ao longo do artigo, visando a demonstrar a complexidade do cipoal normativo que informa o conceito jurídico-legal de “dívida pública fundada ou consolidada”. Colaciono o excerto:

Art. 1º Subordina-se às normas estabelecidas nesta Resolução a dívida pública consolidada e a dívida pública mobiliária dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios.
§ 1º Considera-se, para os fins desta Resolução, as seguintes definições:
[...]
III - dívida pública consolidada: montante total, apurado sem duplicidade, das obrigações financeiras, inclusive as decorrentes de emissão de títulos, do Estado, do Distrito Federal ou do Município, assumidas em virtude de leis, contratos, convênios ou tratados e da realização de operações de crédito para amortização em prazo superior a 12 (doze) meses, dos precatórios judiciais emitidos a partir de 5 de maio de 2000 e não pagos durante a execução do orçamento em que houverem sido incluídos, e das operações de crédito, que, embora de prazo inferior a 12 (doze) meses, tenham constado como receitas no orçamento; [...]

           Chamo a atenção do leitor para um ponto interessante. A Resolução nº 40/01 do Senado Federal traz também o conceito de “dívida pública consolidada líquida”. Reproduzo o inc. V do mesmo art. 1º:

V - dívida consolidada líquida: dívida pública consolidada deduzidas as disponibilidades de caixa, as aplicações financeiras e os demais haveres financeiros. [...]

Por fim, penso seja de interesse acrescentar que há diferença entre dívida consolidada e dívida flutuante também quanto à contabilidade pública orçamentária – aqui entendida como a capacidade de afetar ou não o orçamento público. Nesse sentido, é correto afirmar que a dívida pública consolidada reporta-se às obrigações (exigibilidades) contraídas que dependem de autorização legislativa (previsão no orçamento) para amortizações ou resgate. Em sentido contrário, a dívida flutuante representa o total de compromissos financeiros cuja amortização independe de autorização legislativa orçamentária. Com base nesse critério é que o leitor pode compreender o conceito de dívida pública consolidada de “curto prazo”, legalmente estabelecido pela LRF (art. 29, § 3º), para compreender obrigações cujo prazo de vencimento seja inferior a 12 meses, mas que tenham receitas previstas no orçamento. O que, a princípio, seria um contrassenso conceitual (dívida fundada ou consolidada, de ordinário, são aquelas cujo prazo de amortização é superior a 12 meses), justifica-se pelo critério classificatório da “autorização legislativa”, isto é, a previsão de receitas no orçamento. Além disso, esse critério inspirou a redação dos já citados §§ 1º e 2º do art. 115 do Decreto 93.872/86, os quais atrelam, respectivamente, de maneira insofismável, o conceito de dívida pública flutuante àquelas cujo pagamento independe de autorização orçamentária, ao passo que a dívida consolidade faz remissão às exigibilidades que dependem de autorização  legislativa (orçamento) para seja feita amortização ou resgate. 

A intervenção federal espontânea na hipótese do art. 34, V, a, da CF/88

           Tratando agora da intervenção federal, convém recordar ao leitor que a doutrina constitucionalista classifica o ato interventivo, dividindo-o em duas modalidades:
          a) intervenção espontânea: é a modalidade de intervenção em que o interventor age ex officio, independentemente de provocação;
          b) intervenção provocada: é a modalidade de intervenção em que o interventor só decreta a medida se e quando provocado.
          Como no Direito Constitucional Positivo brasileiro somente o Chefe do Executivo Federal tem competência para decretar e executar a intervenção (CF, art. 84, X), é possível dizer que intervenção espontânea é aquela por meio da qual o Presidente da República age de ofício, não necessitando ser provocado para efeito de expedir o decreto interventivo.
          É nesse sentido de intervenção espontânea que se insere a hipótese objeto de meus comentários (CF, art. 34, V, a). Em conclusão: salvo motivo de força maior, sempre que houver desequilíbrio financeiro manifesto na gestão das contas públicas dos Estados ou do Distrito Federal, comprovado pela suspensão do pagamento da dívida pública consolidada por mais de dois anos consecutivos, o Presidente da República poderá intervir diretamente na Fazenda estadual ou distrital, a fim de reorganizar as finanças da unidade da Federação inadimplente. Mas aqui se impõem algumas observações de rigor:   
          a) discricionariedade do juízo presidencial interventivo: nas hipóteses de intervenção espontânea, o Presidente da República não está obrigado a expedir o decreto que formaliza o ato interventivo. Ele pode recusar-se em fazê-lo, sopesando critérios de conveniência e oportunidade da medida interventiva, pois a consubstanciação fática de hipótese constitucional que autoriza a intervenção da União no Estado ou no DF não o vincula.
           b) procedimento de decretação do ato interventivo: caso o Presidente, ao final do seu juízo discricionário de convenicência e oportunidade, entenda pela necessidade de promover a intervenção da União no Estado ou no DF, deverá fazê-lo escudado em procedimento específico. Essa procedibilidade diz respeito à ouvida do Conselho da República (CF, art. 90, I) e do Conselho de Defesa Nacional (CF, art. 91, § 1º, II). Ambos, todavia, são meros órgãos de consulta, aos quais recorre o Presidente na condição de consulente constitucional. Com isso, eventual posicionamento contrário dos Conselhos quanto à intervenção federal não terá o condão de obstar o Chefe do Executivo de promovê-lo.
          Recordo ainda ao leitor que as hipóteses constitucionais de intervenção espontânea do Presidente da República não se exaurem na defesa das finanças públicas (CF, art. 34, V). Haverá igualmente intervenção de tipo espontânea (ex officio) nas hipóteses de defesa da unidade nacional (CF, art. 34, I e II) e defesa da ordem pública (CF, art. 34, III). Em todos esses casos, vale tudo o que disse acima quanto ao juízo presidencial de conveniência e oportunidade do ato interventivo, bem como a necessidade de consulta aos Conselhos da República e da Defesa Nacional.

Conclusão

          Essas foram, assim, algumas linhas doutrinárias com as quais tive o objetivo de esclarecer a hipótese específica da intervenção espontânea para salvaguardar o equilíbrio das finanças públicas estaduais ou distritais. Trata-se, como visto no início deste artigo, daquela constante do art. 34, V, a, da Constituição que, por fazer remissão a conceitos de direito financeiro (dívida fundada, especialmente) mereceu atenção pormenorizada de minha parte - sempre à luz da legislação de regência na matéria (Lei 4.320/64, LC 101/00, Decreto 93.872/86 e Resolução nº 40/01 do Senado Federal).  

terça-feira, 10 de abril de 2012

RESUMO RT - CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE - Parte II: Precedentes Históricos


Recapitulação

          Na primeira parte deste resumo, o leitor pode acompanhar temas como a centralidade do papel da Constituição nos ordenamentos jurídicos, a ideia da interpretação jurídica como instrumento de realização dos fins constitucionais (Constituição como "filtro" axiológico), o controle de constitucionalidade enquanto técnica de correção da falta de unidade das normas do ordenamento (disfunção do sistema jurídico) etc. Também foram objeto de consideração os pressupostos do controle (supremacia da Constituição e rigidez constitucional). Por fim, o controle de constitucionalidade foi contextualizado como sendo uma das possíveis espécies de aplicação do texto da Constituição pela jurisdição constitucional (gênero). Nesse prisma, o controle é técnica corretiva acionável mediante o exercício da jurisdição constitucional nas hipóteses em que o texto supremo serve de parâmetro de aferição da validade de atos normativos inferiores.
          Na segunda parte do resumo, tratarei dos precedentes históricos que ensejaram a atual conformação do constitucionalismo profundamente alicerçado na ideia do controle de constitucionalidade.

O caso Marbury v. Madson e a gênese da doutrina do controle de constitucionalidade: contextualizando o lead case de 1803.

          Entender os precendentes históricos do controle de constitucionalidade implica compreender o contexto no qual eles se desenvolveram. Assim, deve o leitor atentar para o período (início do século XIX) e o local (Estados Unidos da América) em que se deu a formação do precedente apontado, quase à unamidade pela doutrina, como sendo o pioneiro no desenvolvimento da ideia de que o Judiciário poderia controlar a validade de atos hierarquicamente inferiores que tivessem sido editados em desconformidade com o texto da Constituição.
          No início do século XIX, os Estados Unidos da América eram governados pelo presidente John Adams. O ano era 1800. Ao final daquele ano, o pleito consagrou a vitória da oposição, de modo que os republicanos assumiriam o controle dos Poderes Legislativo e Executivo (em 1801, Thomas Jefferson tomaria posse como novo Presidente eleito). Temendo a conjuntura desfavorável que se anunciava para os federalistas da situação, o presidente Adams percbeu que poderia manter a influência do seu grupo político nos negócios do Estado por meio do Poder Judiciário - justamente aquele poder no qual a investidura não é dada, em regra, mediante eleição. 
          Para esse fim, Adams tomou as seguinte atitudes: 1) reorganizou a estrutura do Poder Judiciário Federal (os federalistas aprovaram a lei The Circuit Court Act), para reduzir o número de juízes da Suprema Corte (isso impedia a nomeação de juízes pelo Presidente republicano), bem como para criar novos cargos de juízes federais a serem preenchidos por aliados do Presidente; 2) iniciou a nomeação de quarenta e dois novos juízes de paz, cujos nomes haviam sido indicados por ele (essa autorização para nomeá-los foi dada pela lei conhecida como The Organic Act of the District of Columbia). O Presidente Adams, então, deu ao seu Secretário de Estado (John Marshall) a incumbência de efetuar a nomeação dos indicados para os cargos de juiz de paz. Ao mesmo tempo, antes de deixar o poder, Adams também nomeou Marshall para ocupar o cargo de Presidente da Suprema Corte (Chief Justice).
          Essa segunda medida (nomeação dos juízes de paz) causou problemas. O motivo é que não houve tempo hábil para que todos os quarenta e dois indicados por Adams tomassem posse na magistratura de paz antes que Jefferson assumisse o poder. A situação agravou-se, haja vista que, tão logo foi empossado, o agora Presidente Thomas Jefferson deu ordens ao seu Secretário de Estado (James Madison) para sustar os atos de investidura dos indicados por Adams.
          Pois bem. Um desses nomeados que não obtiveram a investidura no cargo foi justamente William Marbury. Sentido-se prejudicado, Marbury ajuizou uma ação (writ of mandamus) com a finalidade de ver judicialmente certificado seu direito à posse após a regular nomeação ao cargo de juiz de paz. O ano era 1801, mas o pedido fundou-se na lei conhecida como The Judiciary Act, de 1789 (lei que determinava a competência da Suprema Corte para conhecer do writ naquela matéria). A Corte Suprema agendou então o julgamento da ação proposta por Marbury para a sessão de 1802. Porém, como Jefferson havia conseguido revogar a lei de reforma do Judiciário Federal concebida por Adams, já alardeando sua recusa em cumprir as determinações em sentido contrário da Corte Suprema dos EUA (nisso incluída eventual imposição de ato de investidura de juízes de paz nomeados, mas não empossados), o Congresso estadunidense desfez a sessão da Corte de 1802. Assim, aquele Tribunal máximo só voltaria a se reunir em 1803 - data da apreciação do caso Marbury v. Madson.
  
Prolêgomenos da doutrina do controle de constitucionalidade: a decisão do juiz Marshall no caso Marbury v. Madson (1803).

          Julgando o caso Marbury v. Madson, no contexto histórico altamente conturbado a que acima aludi, a Suprema Corte estadunidense desenvolveu as linhas gerais da doutrina do controle de constitucionalidade - ainda hoje reproduzida pela teoria da Constituição. A ideia defendida pelo tribunal, e que acabou revelando uma nova dimensão de entendimento do ordenamento jurídico como um todo, era no sentido de reconhecer o papel do Poder Judiciário na salvaguarda da higidez do texto da Constituição, impedindo, assim, que atos infraconstitucionais, editados em desacordo com seus preceitos, pudessem ser considerados válidos e, consequentemente, parte do cipoal de leis componentes do ordenamento. Segundo esse raciocínio, ao Judiciário caberia, em identificando lei contrária à Constituição, deixar de aplicá-la. Logo, a interpretação jurídica permitiria o expurgo de atos normativos inválidos à luz da Constituição.
          O principal responsável pelo desenvolvimento dessas linhas doutrinárias foi o juiz John Marshall. Este, em seu voto, defendeu que o controle de constitucionalidade decorreria da concepção da ordem jurídico-normativa como um sistema, daí extraindo consequências correlatas, a saber: 1) supremacia da Constituição; 2) judicial review; 3) protagonismo do Poder Judiciário no exercício do controle.
          É possível sintetizar as conclusões do voto de Marshall nos seguintes pontos:
         1) reconhece a Marbury o direito à investidura no cargo de juiz de paz;
         2) admite que a ação cabível (via processual adequada) para obrigar o Poder Executivo a proceder à investidura de Marbury era mesmo o writ of mandamus;
         3) reconhece a legitimidade do Poder Judiciário para compelir agente do Poder Executivo à prática de atos, ressalvadas duas hipóteses: (a) os atos de natureza política; (b) atos discricionários em razão de previsão legal ou constitucional. Para Marshall, portanto, em todas as demais hipóteses em que houvesse obrigação atribuída ao Poder Executivo pela Constituição ou pelas leis, caberia intervenção do Poder Judiciário para impor o cumprimento do dever.
          O leitor precisa notar que o terceiro ponto expresso no voto de Marshall tem relevância sobeja. Segundo o voto do juiz, o Judiciário está autorizado a controlar a constitucionalidade dos atos do Poder Executivo, tendo por suporte os comandos contidos nas leis e na Constituição. É a gênese da ideia do controle jurisdicional da constitucionalidade e da legalidade dos atos do Poder Executivo.
Outro aspecto de inegável importância histórica - talvez o mais importante - do voto de Marshall diz respeito ao reconhecimento da competência do Poder Judiciário para proceder ao controle (no caso, determinando a expedição do writ em favor de Marbury). Para atingir essa conclusão, justificando o controle judicial de constitucionalidade, Marshall sustentou sua tese com base em três argumentos fundamentais:
          1) supremacia da Constituição;
          2) nulidade da lei que contraria a Constituição;    
          3) competência do Poder Judiciário para interpretar, com caráter definitivo e final, o texto da Constituição.
          Esse último argumento foi revolucionário à época, pois a ideia do Judiciário como intérprete final da Constituição era controversa, havendo quem entendesse que os demais Poderes não poderiam ficar submetidos a decisões do Poder Judiciário tomadas com caráter vinculante (tese da autonomia dos Poderes Legislativo e Executivo perante a interpretação judicial). Com a argumentação de Marshall, evidentemente, restou superada a controvérsia. 

Críticas à decisão no caso Marbury v. Madson

          A doutrina aponta algumas críticas à decisão tomada no famoso lead case de 1803. A primeira delas é reconhecer que Marshall tem o mérito de ter explicitado, com argumentos sólidos, as ideias fundantes do controle jurisdicional de constitucionalidade, tal como é conhecido hoje na maioria dos países democráticos. No entanto, não se pode atribuir à Marshall a "invenção" da ideia de controle, pois a historiografia registra precedentes nesse sentido no período da Antiguidade, no Medievo. Nos Estados Unidos também já havia doutrina que pugnava pela invalidade dos atos legislativos contrários à Constituição.
          É preciso ainda observar que Marshall usou de sua rica capacidade argumentativa para legitimar o seu próprio poder enquanto presidente da Suprema Corte dos EUA. Afinal, atribuindo ao Judiciário o papel de figurar como o intérprete final da Constituição, mediante o juízo de constitucionalidade dos atos dos Poderes Executivo e Legislativo, Marshall reconhecia também ser possível ao tribunal que presidia proceder à revisão desses atos, quando eivados de inconstitucionalidade, o que lhe dava um poder de barganha política excepcional.

Principais contribuições do caso Marbury v. Madson para o controle de constitucionalidade

          Após toda a exposição, torna-se possível sintetizar as principais contribuições do voto de Marshall no precedente Marbury v. Madson (1803) para a doutrina do controle jurisdicional de constitucionalidade - parte indissociável do constitucionalismo moderno. Ei-las:
          1) reconhecimento do princípio da supremacia da Constituição;  
          2) judicial review: possibilidade de controle, pelo Poder Judiciário, dos atos do Poder Legislativo e do Poder Executivo quando contrários à Constituição, declarando-os inválidos (atos nulos);
          3) competência do Poder Judiciário para atuar como intérprete final do texto da Constituição.

quinta-feira, 5 de abril de 2012

RESUMO RT - CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE - Parte I: Dos Conceitos Fundamentais


SEÇÃO RESUMO RT: Controle de Constitucionalidade - Parte I: Dos Conceitos Fundamentais 

A cada ano se vem notando uma revolução no direito constitucional do Brasil. São aspetos desse processo a normatividade dos princípios, a busca da efetividade das normas constitucionais, novas técnicas de interpretação constitucional. Há também a vaga do neoconstitucionalismo - que vem sendo incensada da processualística cível à dogmática constitucionalista contemporânea, variando as nomenclaturas doutrinárias em pós-positivismo ou neopositivismo, conforme o prisma adotado pelo doutrinador.
Nesse contexto de aumento da relevância do papel da Constituição na centralidade do sistema é que o controle de constitucionalidade ganha relevo. Assim ocorre, visto que a jurisdição constitucional encontra no controle meio essencial para o desenrolar das ideias que permeiam o constitucionalismo. O maior exemplo disso é a teoria dos direitos fundamentais. Não há direito fundamental sem que seja assegurada a supremacia do texto da Constituição. Da mesma maneira, é inviável pensar em concretude da dignidade da pessoa humana ou princípio republicano/democrático de participação popular no poder no cenário de um texto constitucional fragilizado.   
A centralidade do sistema jurídico é lugar ocupado pela Constituição de acordo com a unanimidade dos constitucionalistas modernos, podendo ser tanto do ponto de vista formal (normas de elaboração mais difícil) quanto material (axiológica). A Carta é um filtro para leis infraconstitucionais, mas é também uma maneira de interpretar a vida, haja vista determinar um conjunto de valores a serem seguidos por uma dada sociedade.
A interpretação jurídica, nesse sentido, é meio para o atingimento dos fins constitucionais. Daí se dizer em doutrina que interpretar o direito é interpretar a Constituição. É que seu texto deve ser sempre objeto de cogitação pelo intérprete, seja de maneira direta (a pretensão, objeto da demanda, se funda em norma constitucional), seja indireta (a pretensão se funda em ato normativo infraconstitucional). O intérprete, assim, diante do caso concreto, deve:
1) antes de aplicar a norma - verificar sua compatibilidade com o texto supremo, sob pena de cassar sua incidência;
2) no momento da aplicação - orientar sua exegese para o sentido e os fins ("telos") propugnados pelo projeto de constitucionalidade insculpido no texto político supremo.

O ordenamento jurídico como sistema e o controle de constitucionalidade

Temos que considerar ainda que o ordenamento jurídico é um sistema que deve funcionar de maneira harmoniosa. A desarmonia, consubstanciada na falta de unidade de suas normas, exige correção. Esse mecanismo corretivo é dado, dentre outros, pela técnica do controle de constitucionalidade. Com isso, o intérprete há de verificar se há compatibilidade entre lei ou ato normativo infraconstitucional com a Constituição. Se faltar a compatibilidade investigada, o intérprete há de reconhecer a invalidade da norma contrastante, declarando-a, ato contínuo, inconstitucional. É a declaração de inconstitucionalidade que subtrai a dimensão de eficácia da norma, resguardando a unidade do sistema imposta pela intangibilidade do texto (central) da Constituição.
A partir disso, já percebemos que a concretização do direito envolve necessariamente um juízo de constitucionalidade. É imperioso que o intérprete, sempre que deparar com ato normativo não integrante do texto da Constituição, proceda a esse ato mental de controle. Caso contrário, aplicar-se-ia uma norma incompatível com a Constituição e, portanto, deixar-se-ia de aplicar a própria Constituição. Isso, à evidência, não pode ocorrer, pois o ordenamento, diante do conflito entre ato infraconstitucional e norma constitucional deve pender sempre em favor da prevalência da segunda, a fim de assegurar sua supremacia formal.

Pressupostos do controle de constitucionalidade

Segundo a doutrina, o controle de constitucionalidade visa a assegurar que o texto da Constituição seja supremo e rígido. Logo, são pressupostos que fundamentam a técnica do controle a supremacia e a rigidez constitucionais. Ou, por outras palavras, não pode haver controle de constitucionalidade que tenha como parâmetro texto constitucional não supremo e não rígido (flexível).         
Diz-se supremo o texto da Constituição, em razão de este ocupar uma posição hierarquicamente superior na estrutura escalonada do ordenamento jurídico. É, com efeito, o referido texto o fundamento de validade de todas as demais normas jurídicas. Daí por que todo e qualquer ato jurídico que esteja em desconformidade com a Constituição é inválido e atrai a operação mental do controle que visa a expurgá-lo do ordenamento jurídico. Só assim resta assegurado o pressuposto da supremacia. O controle de constitucionalidade existe, desse modo, para assegurar a supremacia formal da Constituição.
Diz-se rígido o texto constitucional cujas normas que o integram tenham processo de elaboração dificultado. Pela rigidez constitucional há um processo legislativo qualificado de normogênese (criação da norma constitucional), o que autoriza a que o texto da Constituição seja usado como parâmetro (paradigma de validade) para o controle das demais normas cujo processo normogenético não seja tão complexo – isto é, as normas infraconstitucionais. Se se admitisse, por exemplo, que uma lei ordinária tivesse idêntico status ao de uma norma constitucional, em havendo contraste entre uma e outra, a resolução do conflito não demandaria controle de constitucionalidade (juízo de verificação de compatibilidade hierárquica entre normas superiores e normas inferiores); bastaria ao intérprete adotar o critério lex posterior derogat legi priori, isto é, a norma posterior revogaria a norma anterior (o Decreto-Lei 4.657/42 adota esse critério no seu art. 2º, § 1º, mas isso só serve para conflitos de normas de mesma hierarquia). É preciso, portanto, que haja distinção formal (diferentes graus hierárquicos) entre as espécies normativas. A norma que serve de parâmetro para o controle (a norma constitucional) deve ser hierarquicamente superior à norma que serve de objeto para o controle (em regra, norma infraconstitucional, embora seja possível alegar inconstitucionalidade de norma constitucional inserida no texto supremo pelo poder de emendabilidade). E essa posição diversa de graus na hierarquia normativa decorre precisamente da rigidez constitucional que impõe especial dificuldade procedimental ao processo legislativo de elaboração das normas da Constituição.
Outros pressupostos também cercam os fundamentos do controle de constitucionalidade. A proteção contra maiorias parlamentares eventuais é um deles. Sua razão de ser é impedir que conveniências políticas de momento possam vulnerar valores pretendidos pela sociedade como um todo e, por conseguinte, inscritos no texto constitucional. É aí que surge o debate, ainda hoje deveras polêmico na iusfilosofia, relativo à legitimidade democrática do controle de constitucionalidade.

Objeto do controle e jurisdição constitucional

Em regra, a técnica do controle de constitucionalidade é invocada para verificar a compatibilidade de atos disciplinadores de condutas em caráter geral e abstrato, isto é, atos materialmente normativos. Normalmente, esses atos (leis) são produzidos pelo Poder Legislativo. Mas existem atos normativos que, embora não originados no Parlamento, submetem-se igualmente ao controle de sua constitucionalidade. Exemplo disso são as medidas provisórias e atos administrativos normativos (da lavra do Poder Executivo) e os regimentos internos dos tribunais (da lavra do Poder Judiciário). Poderíamos ainda cogitar de outros atos “controláveis”. Atos materialmente administrativos (não normativos) e atos (decisões) judiciais também estão sujeitos ao controle, haja vista que os primeiros podem ser declarados inválidos pelos juízes e tribunais, enquanto os segundos podem ser impugnados pela via do recurso, que traz, no rol das suas hipóteses de cabimento, a possibilidade de alegar contrariedade da decisão às normas constitucionais. Disso se infere que o controle de constitucionalidade, ao fim e ao cabo, abrange ato de quaisquer dos três Poderes republicanos.
Vale recordar que toda a operação mental consistente na técnica do controle de constitucionalidade decorre do exercício da jurisdição constitucional. Mas a jurisdição constitucional não se resume ao controle, não é sinônimo de controle. Logo, é preciso diferençar, de um lado, o conceito de jurisdição constitucional e, de outro, o do controle de constitucionalidade.
A jurisdição constitucional é o nome dado à atividade de aplicação das normas da Constituição por juízes e tribunais. Essa aplicação pode ser de duas ordens: (a) direta – caso em que o intérprete reconhece que a norma constitucional disciplina diretamente o caso sub examine; (b) indireta – caso em que a Constituição serve ou de parâmetro de validade para o teste de constitucionalidade de uma norma ou de referência hermenêutica, figurando como o “guia” do intérprete na atividade de atribuir um sentido às normas infraconstitucionais. Somente se pode falar em controle de constitucionalidade quando estivermos diante da aplicação indireta da Constituição, ou seja: quando a norma constitucional é paradigma de análise da validade de normas hierarquicamente inferiores a ela.