sexta-feira, 27 de fevereiro de 2015

RT COMENTA - DIREITO AMBIENTAL - Instrumentos do Direito Ambiental


Prova: Advogado BNDES 2013 
Tipo: Objetiva
Banca:
 
3 - Questão 7
70
Os instrumentos do Direito Ambiental são fundamentais para a garantia do direito difuso ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, sendo que
 
(A) a audiência pública deve ser realizada nos casos que envolvam atividades capazes de causar significativa degradação ambiental, exceto quando o Ministério Público solicitar sua dispensa.


(B) a unidade de conservação da natureza deve ter sua criação precedida de consultas públicas, inclusive em relação às categorias voltadas para pesquisas científicas (estação ecológica e reserva biológica).


(C) a cobrança pelos recursos hídricos não é permitida pela legislação ambiental, tendo em vista a importância da água para toda espécie de vida.


(D) o plano de resíduos sólidos que deve ser elaborado pelos Municípios, inclusive com vistas ao acesso a determinados recursos da União, constitui obrigação relacionada à garantia da saúde da população.


(E) os estudos prévios de impacto ambiental (EIA) devem ser elaborados pelos servidores ambientais do órgão ou entidade ambiental competente pelo licenciamento ambiental, às custas do empreendedor.
 
 
 

(A) a audiência pública deve ser realizada nos casos que envolvam atividades capazes de causar significativa degradação ambiental, exceto quando o Ministério Público solicitar sua dispensa.

A alternativa A está errada.

Entre os princípios do Direito Ambiental, encontra-se o princípio da participação comunitária. Ele foi expressamente previsto na Declaração do Rio sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento:  
 
Princípio 10


A melhor maneira de tratar as questões ambientais é assegurar a participação, no nível apropriado, de todos os cidadãos interessados. No nível nacional, cada indivíduo terá acesso adequado às informações relativas ao meio ambiente de que disponham as autoridades públicas, inclusive informações acerca de materiais e atividades perigosas em suas comunidades, bem como a oportunidade de participar dos processos decisórios. Os Estados irão facilitar e estimular a conscientização e a participação popular, colocando as informações à disposição de todos. Será proporcionado o acesso efetivo a mecanismos judiciais e administrativos, inclusive no que se refere à compensação e reparação de danos.

A partir do princípio da participação comunitária, o art. 3º da Res. 237/1997 do CONAMA, que regula o procedimento de licenciamento ambiental, previu a possibilidade de realização de audiências públicas (grifo meu): 

 

Art. 3º- A licença ambiental para empreendimentos e atividades consideradas efetiva ou potencialmente causadoras de significativa degradação do meio dependerá de prévio estudo de impacto ambiental e respectivo relatório de impacto sobre o meio ambiente (EIA/RIMA), ao qual dar-se-á publicidade, garantida a realização de audiências públicas, quando couber, de acordo com a regulamentação.
Parágrafo único. O órgão ambiental competente, verificando que a atividade ou empreendimento não é potencialmente causador de significativa degradação do meio ambiente, definirá os estudos ambientais pertinentes ao respectivo processo de licenciamento.
    

Esse ato infralegal do CONAMA incluiu ainda as audiências públicas qual etapa facultativa do procedimento de licenciamento ambiental. É o que consta do art. 10, V, da supracitada resolução:
 

Art. 10 - O procedimento de licenciamento ambiental obedecerá às seguintes etapas:
V - Audiência pública, quando couber, de acordo com a regulamentação pertinente;
   
 
 

Disse que as audiências públicas constituem-se em etapa facultativa, visto que seu cabimento foi condicionado à regulamentação pertinente, que é aquela prevista na Res. 09/1987 do CONAMA:
 

Art. 1º - A Audiência Pública referida na RESOLUÇÃO/conama/N.º 001/86, tem por finalidade expor aos interessados o conteúdo do produto em análise e do seu referido RIMA, dirimindo dúvidas e recolhendo dos presentes as críticas e sugestões a respeito.


Já no art. 2º encontramos os requisitos que dizem respeito à convocação das audiências:
 
Art. 2º - Sempre que julgar necessário, ou quando for solicitado por entidade civil, pelo Ministério Público, ou por 50 (cinqüenta) ou mais cidadãos, o Órgão de Meio Ambiente promoverá a realização de audiência pública.

A alternativa A cobrou esses requisitos do art. 2º da Res. 09/1987 do CONAMA. E, pelo visto, descabe falar em dispensa de audiência pública pelo órgão ministerial, haja vista o caráter facultativo com que se apresentam no procedimento de licenciamento ambiental. Na verdade, cabe ao Ministério Público solicitar a realização da audiência, a fim de garantir o princípio da participação comunitária no Direito Ambiental.  


(B) a unidade de conservação da natureza deve ter sua criação precedida de consultas públicas, inclusive em relação às categorias voltadas para pesquisas científicas (estação ecológica e reserva biológica).

A alternativa B está errada.

Trata-se de alternativa que cobrou a letra da lei. Na questão, o diploma legal em comento é a Lei 9.985/00 (Lei do SNUC).

Segundo a LSNUC, em regra, as unidades de conservação da natureza são criadas por ato do Poder Público, devendo ser precedida de estudos técnicos e consulta pública. Mas há uma exceção: quando se tratar de criação de Estação Ecológica ou Reserva Biológica, a consulta pública não é obrigatória. É o que se extrai do §§ 2º e 4º do art. 22 da LSNUC (grifos meus):  
 
Art. 22. As unidades de conservação são criadas por ato do Poder Público.
§ 1º (VETADO)
§ 2º A criação de uma unidade de conservação deve ser precedida de estudos técnicos e de consulta pública que permitam identificar a localização, a dimensão e os limites mais adequados para a unidade, conforme se dispuser em regulamento.
§ 3º No processo de consulta de que trata o § 2º, o Poder Público é obrigado a fornecer informações adequadas e inteligíveis à população local e a outras partes interessadas.
§ 4º Na criação de Estação Ecológica ou Reserva Biológica não é obrigatória a consulta de que trata o § 2º deste artigo.
(omissis)

Logo, está incorreta a alternativa B.

 
(C) a cobrança pelos recursos hídricos não é permitida pela legislação ambiental, tendo em vista a importância da água para toda espécie de vida.

A alternativa C está errada.

Aqui é preciso recordar o princípio do usuário-pagador. Segundo esse princípio, o usuário de recursos naturais pode ser compelido a pagar pelo uso. Enquanto o princípio do poluidor-pagador preconiza a internalização, pelo empreendedor, dos custos das externalidades negativas no processo produtivo, o do usuário-pagador autoriza a cobrança pela utilização de recursos naturais. Duas são as finalidades: de um lado, propiciar à sociedade uma contrapartida financeira pelo uso do bem comum, de outro, incentivar o aproveitamento racional dos recursos naturais, de modo a evitar o seu desperdício.

O fundamento ex lege do usuário-pagador encontra-se no art. 4º, VII, in fine, da LPNMA (grifo meu):

 
Art 4º - A Política Nacional do Meio Ambiente visará:
(omissis)
VII - à imposição, ao poluidor e ao predador, da obrigação de recuperar e/ou indenizar os danos causados e, ao usuário, da contribuição pela utilização de recursos ambientais com fins econômicos.


Em consequência do influxo do princípio do usuário-pagador, a Lei 9.433/97 (Lei da Política Nacional de Recursos Hídricos) previu expressamente a possibilidade de cobrança pela utilização da água, que é bem de domínio público. Colaciono (grifo meu):  

 
Art. 5º São instrumentos da Política Nacional de Recursos Hídricos:


        I - os Planos de Recursos Hídricos;


        II - o enquadramento dos corpos de água em classes, segundo os usos preponderantes da água;


        III - a outorga dos direitos de uso de recursos hídricos;


        IV - a cobrança pelo uso de recursos hídricos;


        V - a compensação a municípios;


        VI - o Sistema de Informações sobre Recursos Hídricos.

O STJ tem adotado esse posicionamento nos seus julgados (grifo meu):

 

PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. RECURSO ESPECIAL. SERVIÇO PÚBLICO. FORNECIMENTO DE ÁGUA. POLÍTICA TARIFÁRIA. TARIFA PROGRESSIVA. LEGITIMIDADE (LEI 6.528/78, ART. 4º; LEI 8.987/95, ART. 13). DOUTRINA. PRECEDENTES. PROVIMENTO.
1. O faturamento do serviço de fornecimento de água com base na tarifa progressiva, de acordo com as categorias de usuários e as faixas de consumo, é legítimo e atende ao interesse público, porquanto estimula o uso racional dos recursos hídricos. Interpretação dos arts. 4º, da Lei 6.528/78, e 13 da Lei 8.987/95.
2. "A política de tarifação dos serviços públicos concedidos, prevista na CF (art. 175), foi estabelecida pela Lei 8.987/95, com escalonamento na tarifação, de modo a pagar menos pelo serviço o consumidor com menor gasto, em nome da política das ações afirmativas, devidamente chanceladas pelo Judiciário (precedentes desta Corte)" (REsp 485.842/RS, Rel. Min. Eliana Calmon, DJ de 24.5.2004).
3. Recurso especial provido, para se reconhecer a legalidade da cobrança do serviço de fornecimento de água com base na tarifa progressiva e para julgar improcedente o pedido.
(STJ, REsp 861.661/RJ, Primeira Turma, Rel. Min. Denise Arruda, j. 13/11/2007, p. DJ 10/12/2007). 


A contrario sensu do afirmado na alternativa C, a cobrança da água justifica-se exatamente ante a sua imprescindibilidade para a vida humana, considerando-se sobretudo se cuidar de um recurso natural limitado, dotado de valor econômico, e que, consequentemente, merece ser utilizado com racionalidade (proibição do desperdício).

(D) o plano de resíduos sólidos que deve ser elaborado pelos Municípios, inclusive com vistas ao acesso a determinados recursos da União, constitui obrigação relacionada à garantia da saúde da população.

A alternativa D está correta.

Para entendê-la, é preciso mencionar a Lei 12.305/10 (Lei da Política Nacional de Resíduos Sólidos - LPNRS). Segundo esse diploma, o gerenciamento de resíduos sólidos consubstancia o conjunto de ações exercidas, direta ou indiretamente, nas etapas de coleta, transporte, transbordo, tratamento e destinação final ambientalmente adequada dos resíduos sólidos e disposição final ambientalmente adequada dos rejeitos (art. 3º, X). Esse gerenciamento deve efetuar-se de acordo com um plano municipal de gestão integrada de resíduos sólidos ou com um plano de gerenciamento de resíduos sólidos.

O plano de resíduos sólidos é um dos instrumentos da Política Nacional de Resíduos Sólidos (art. 8º, I). É um conceito amplo, a abranger como uma de suas espécie os planos municipais de gestão integrada de resíduos sólidos (art. 14, V). A lei estipula para os planos municipais de resíduos sólidos um conteúdo mínimo (art. 19), estatuindo ainda que a elaboração deles é condição para que os Municípios possam ter acesso aos recursos da União (art. 18, caput).

Nesse contexto, é evidente que a assertiva está correta ao afirmar que os planos municipais constituem obrigação relacionada à garantia de saúde da população, haja vista que um dos objetivos da Política Nacional de Resíduos Sólidos é precisamente o de assegurar proteção à saúde pública (art. 7º, I). Prova disso é que o Poder Público deve atuar, subsidiariamente, com vistas a minimizar ou cessar o dano, logo que tome conhecimento de evento lesivo ao meio ambiente ou à saúde pública relacionado ao gerenciamento de resíduos sólidos (art. 29), tudo para salvaguardar a qualidade ambiental.     

(E) os estudos prévios de impacto ambiental (EIA) devem ser elaborados pelos servidores ambientais do órgão ou entidade ambiental competente pelo licenciamento ambiental, às custas do empreendedor.

A alternativa E está errada.

De acordo com o modelo brasileiro, o EIA não é elaborado pelos órgãos ambientais. Quem deve providenciar a elaboração do EIA é o próprio empreendedor, conforme se verifica do art. 11 da Res. 237/97 do CONAMA (grifo meu):
 
Art. 11 - Os estudos necessários ao processo de licenciamento deverão ser realizados por profissionais legalmente habilitados, às expensas do empreendedor.
Parágrafo único - O empreendedor e os profissionais que subscrevem os estudos previstos no caput deste artigo serão responsáveis pelas informações apresentadas, sujeitando-se às sanções administrativas, civis e penais.

Portanto, o EIA/RIMA, que é modalidade da AIA, e constitui etapa do procedimento de licenciamento ambiental (Res. 237/97, art. 10, II), fica sob a responsabilidade do requerente da licença, ao qual se impõe o pagamento de todos os custos e despesas inerentes aos estudos ambientais pertinentes. 

Nesse prisma, vale a pena lembrar do art. 17 da LPNMA:
 
Art. 17. Fica instituído, sob a administração do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis - IBAMA:  
I - Cadastro Técnico Federal de Atividades e Instrumentos de Defesa Ambiental, para registro obrigatório de pessoas físicas ou jurídicas que se dedicam a consultoria técnica sobre problemas ecológicos e ambientais e à indústria e comércio de equipamentos, aparelhos e instrumentos destinados ao controle de atividades efetiva ou potencialmente poluidoras;  
II - Cadastro Técnico Federal de Atividades Potencialmente Poluidoras ou Utilizadoras de Recursos Ambientais, para registro obrigatório de pessoas físicas ou jurídicas que se dedicam a atividades potencialmente poluidoras e/ou à extração, produção, transporte e comercialização de produtos potencialmente perigosos ao meio ambiente, assim como de produtos e subprodutos da fauna e flora.  

Pelo disposto no inc. I do art. 17, a lei autoriza que o requerente da licença ambiental contrate equipe especializada para a elaboração do EIA/RIMA, mas desde que esta tenha registro no Cadastro Técnico Federal de Atividades e Instrumentos de Defesa Ambiental, sob a administração do IBAMA.

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